André Oliveira Paggiaro
DOI: 10.5935/2595-170X.20240014
A mais recente edição da Revista Brasileira de Queimadura (RBQ) apresenta uma grande diversidade de temas entre os artigos publicados. Entre os assuntos abordados, temos a influência da Covid-19 no atendimento de queimaduras, o "coping" em queimados, as evidências de curativos à base de mel e uma análise da mensuração de superfície corpórea queimada realizada por serviços de emergências não especializados. Porém, um deles merece especial destaque. Trata-se de um estudo experimental, realizado em ratos, que comparou diferentes tipos de curativo à base de prata em queimaduras de espessura parcial. Os autores avaliaram os desfechos cicatrização, produção de fibras elástica e fibras colágenas. O curativo-controle com soro fisiológico mostrou-se menos agressivo ao tecido quando comparado com os demais, entretanto, não foi observada diferença quanto ao desfecho cicatrização. Assim, mesmo considerando suas limitações, o uso de um modelo experimental permitiu analisar alguns efeitos biológicos, os quais não poderiam ser observados com os estudos clínicos.
Esse tipo de trabalho é o que conhecemos como pesquisa básica aplicada. A pesquisa básica busca produzir conhecimento importante para a ciência, sem necessariamente haver uma aplicação prática clinica. Por outro lado, a pesquisa aplicada tem como objetivo gerar repostas para questões práticas, com o intuito de clarificar dúvidas observadas no cotidiano clínico. Em geral, esses estudos costumam apresentar um alto rigor científico, procedimentos com auxílio de tecnologias avançadas, cuidado metodológico, preocupação com as padronizações dos parâmetros de análise, múltiplos testes para avaliação de resultados e análises estatísticas completas. Entretanto, todas essas características acarretam um aumento nos custos dos projetos, dificultando a sua realização. Talvez, essa seja a causa de, nos meus dois anos como editor da RBQ, ter recebido apenas dois desse tipo de estudo para avaliação. Ambos tinham alta qualidade e acabaram sendo publicados.
Assim, é fundamental iniciarmos um processo de reflexão dos motivos da baixa quantidade de pesquisa básica em queimados realizada no Brasil. Possíveis explicações para esse fenômeno podem ser a falta de aulas sobre queimaduras nas instituições de ensino superior, causando um desconhecimento dos alunos sobre essa temática, a falta de estrutura em equipamentos e insumos nas universidades ou a escassez de financiamento, tanto público como privado. A melhora desses problemas poderia aumentar a produção nacional de pesquisa básica aplicada para melhora do cuidado em queimaduras.