1243
Visualizações
Acesso aberto Revisado por pares
Artigo Original

Percepções da equipe de enfermagem acerca da prática da educação em saúde em um centro de tratamento de queimados

Perceptions of the nursing team about the practice of health education in a center of burn treatment

Vitória Ximenes Lima1; Maria Eliane Maciel de Brito2

RESUMO

OBJETIVO: Analisar a percepçao da equipe de enfermagem acerca da prática da educaçao em saúde no contexto hospitalar em um Centro de Tratamento de Queimados (CTQ).
MÉTODO: Trata-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, do tipo descritiva e exploratória, na qual participaram oito enfermeiras que trabalham no CTQ. A coleta de dados foi realizada por meio do roteiro de entrevista semiestruturada, aplicada de forma particular e em ambiente reservado no próprio local de trabalho das enfermeiras que aceitaram participar como sujeitos de pesquisa, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS: Os dados foram analisados segundo a técnica da análise temática. Após a análise dos dados por meio das unidades de significado e processo de categorizaçao, emergiram três temáticas essenciais, sendo elas: Percepçao do enfermeiro sobre Educaçao em Saúde; Educaçao em Saúde: Contribuiçoes para o cuidado em queimadura; Estratégias para Implementaçao da Educaçao em Saúde no Contexto Hospitalar.
CONCLUSAO: As participantes do estudo destacam a importância de inserir, de forma consistente, a educaçao em saúde na instituiçao, valorizando sua relevância em toda a rede de saúde. Contudo, as observaçoes permitem afirmar que as mesmas nao a colocam em prática de forma rigorosa, existindo a necessidade de organizaçao e preparo das açoes educativas a serem desenvolvidas junto aos pacientes e/ou acompanhantes.

Palavras-chave: Educação em Saúde. Enfermagem. Assistência Hospitalar. Unidades de Queimados.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To analyze the perception of the nursing team in terms of health education practice in the hospital setting in a Burns Treatment Center (BTC).
METHODS: This is a research with qualitative approach, descriptive and exploratory, which was attended by eight nurses who work in BTC. Data collection was carried out by the application of a semi structural interview, with a guide previously elaborated. The interview was conducted in a private way and in a reserved environment in the workplace of the nurses, who agreed to participate as investigation subjects after signing the Inform Consent Form.
RESULTS: The data were analyzed according to the thematic analysis technique. After the analysis of the data by means of the units of meaning and process of categorizing emerged three essential themes, and they: Nurses' Perception of Health Education, Health Education: contributions to care of burns and Strategies for the Implementation of Health Education in hospital context.
CONCLUSION: The participants of the study highlight the importance of entering, consistently, health education at the institution, emphasizing its relevance throughout the health network. However, the observations allow us to affirm that they do not put into practice in a rigorous fashion, with the necessity of organization and preparation of educational actions to be developed with the patients and/or companions.

Keywords: Health Education. Nursing. Hospital Care. Burn Units.

INTRODUÇAO

A incidência de agravos à saúde por queimaduras vem aumentando a cada ano. Os atendimentos sao realizados nos serviços especializados de emergência, configurando um sério problema de saúde pública, uma vez que grande parte desses atendimentos necessita de internaçoes, o que acaba trazendo, como consequência, onerosas despesas ao Estado1.

É caracterizada como uma das mais devastadoras de todas as lesoes, sendo o quarto tipo mais comum de trauma em todo mundo, seguida por acidentes de trânsito, queda e violência interpessoal. Sua incidência se dá em países subdesenvolvidos, e em regioes que normalmente nao possuem uma infraestrutura necessária para reduzir seu número de ocorrência e gravidade2.

A configuraçao atual do sistema de saúde brasileiro evidencia a necessidade de incorporar junto à atençao secundária e terciária práticas de promoçao da saúde que nao levem apenas em consideraçao o modelo biológico do processo saúde-doença, mas que abranjam o processo histórico-cultural, agregando à saúde os determinantes socioeconômicos3. Isso ocorre, especialmente, pela educaçao em saúde, que se efetiva pelas açoes educativas voltadas ao indivíduo na sua singularidade4.

As atividades educativas entrelaçadas à educaçao em saúde devem estar presentes em todos os níveis de atençao, no entanto, é na atençao primária que esta é mais colocada em prática. Porém, tida como uma estratégia direcionada para promoçao, prevençao, cura e reabilitaçao, ela deveria estar inserida em todos os níveis de atençao à saúde e em todos os espaços em que seja possível realizar estas açoes, objetivando a melhoria do nível de vida dos usuários do sistema de saúde3.

Apesar da importância, o que se observa é que as práticas de educaçao em saúde na atençao secundária e terciária têm sido colocadas em segundo plano, já que a atuaçao da enfermagem se ocupa de outras tarefas, estando as práticas dos enfermeiros, em sua maioria, voltadas aos serviços assistenciais e de gerência, realizando as atividades educativas em menor frequência3.

Compreende-se que, para alcançar uma comunicaçao mais eficaz, é imprescindível que os educadores em saúde conheçam a realidade e as expectativas de cada sujeito nesse processo, a fim de que possam priorizar as necessidades do indivíduo e nao apenas as necessidades terapêuticas5. Dessa forma, a educaçao em saúde somada à promoçao da saúde, utilizando a educaçao como uma forma de cuidar, vai além dos preceitos básicos do cuidado6.

Atualmente, observam-se profissionais de enfermagem carentes de pensamento crítico-reflexivo em seus cenários de atuaçao e, sobretudo, com dificuldades em mudar padroes impostos pela instituiçao em que exercem suas práticas de saúde7.

O enfermeiro é chamado a renovar sua prática de cuidado para um modelo mais abrangente, em que a educaçao está intrinsecamente ligada à assistência. Deste modo, o mesmo deve transcender seus conhecimentos para poder permitir uma mudança no contexto de atençao, no qual o enfoque era apenas o tratamento da doença, para contemplar de forma integral o indivíduo, que se encontra momentaneamente doente, retornando logo após para o convívio social8.

É na hospitalizaçao junto aos cuidados à saúde que devem ser abordadas açoes educativas que permitam promover o autocuidado, preparar o paciente para os procedimentos a serem realizados para que resultem em impactos positivos ao tratamento que se deseja implementar3. Assim sendo, poderá contribuir para a transformaçao das condiçoes de trabalho, bem como, favorecer ao enfermeiro a criaçao de vínculo com o paciente numa relaçao horizontal, dialógica, recíproca e verdadeiramente humanizada9.

Além disso, o período de hospitalizaçao traz como consequências vários problemas, dentre eles sociais, financeiros e, sobretudo, psicológicos tanto para os pacientes como também para os familiares1. O atendimento educacional em ambiente hospitalar se insere no contexto da humanizaçao da assistência, tratando o sujeito de forma integral, respeitando as peculiaridades da conjuntura social e política em que está inserido e nao mais visto apenas como um corpo doente9.

Nesse contexto, a Política Nacional de Humanizaçao declara que o processo de trabalho nos serviços de saúde deve ser construído de acordo com os princípios do Sistema Unico de Saúde (SUS), estimulando a comunicaçao entre gestores, trabalhadores e usuários para o enfrentamento das relaçoes de poder, trabalho e afeto, produzindo mudanças no modo de gerir e cuidar10.

Esta estratégia de cuidado desenvolvida em ambientes hospitalares pode e deve incluir os familiares e, se necessário, devem ser criados espaços para promover o diálogo entre profissionais e pacientes/acompanhantes. Todavia, as práticas educativas em saúde nao devem ser trabalhadas de forma pontual, mas em todos os momentos em que se realiza o cuidado, e sempre que houver interaçao entre o profissional e usuários do sistema de saúde e seus familiares3.

Nesse processo é fundamental a participaçao dos familiares/acompanhantes, pois a presença constante dos mesmos pode contribuir no cuidado em saúde e na construçao de novas formas de organizaçao da assistência, na medida em que sua presença pode colaborar numa melhor evoluçao do estado de saúde do paciente.

A inclusao dos usuários/acompanhantes obedece às diretrizes do SUS e permite a participaçao cidada no cotidiano das práticas de saúde, portanto, nos serviços de saúde. Assim, busca facilitar a criaçao de espaços de grupalizaçao, permitindo uma opiniao crítica e reflexiva sobre o trabalho em saúde, como também ampliar a responsabilizaçao dos profissionais de saúde em suas práticas11.

Dentre as estratégias sugeridas para a instituiçao da educaçao em saúde dentro do ambiente hospitalar, salienta-se a criaçao de espaços de discussao nas unidades de trabalho para que os usuários e seus acompanhantes possam sanar suas dúvidas, ênfase na escuta dos usuários, como também a elaboraçao de material educativo contendo orientaçoes e esclarecimentos sobre a saúde, de modo a beneficiar tanto os pacientes e seus acompanhantes como os profissionais de saúde em seu processo de trabalho.

Logo, a Residência Integrada em Saúde vem para reafirmar a importância da prática da educaçao em saúde no Centro de Tratamento de Queimados (CTQ), visto que o interesse pelo assunto surgiu mediante a experiência da pesquisadora, enquanto residente de enfermagem, que em seu cotidiano pôde proporcionar a criaçao de espaços de discussao com acompanhantes para promover o entendimento do estado de saúde do paciente, bem como de procedimentos e termos usados durante o atendimento.

Diante da relevância do tema abordado e da necessidade de estudos sobre a prática da educaçao em saúde na atençao secundária e terciária, objetivou-se, neste artigo, analisar a percepçao da equipe de enfermagem acerca da prática da educaçao em saúde no contexto hospitalar em um CTQ, descrevendo como a equipe de enfermagem define educaçao em saúde e identificando suas contribuiçoes no ambiente hospitalar.


MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo e exploratório, que utilizou a abordagem qualitativa, visto que tal modalidade trabalha com um espaço mais intenso das relaçoes, dos processos e dos fenômenos, que nao podem ser reduzidos à operacionalizaçao de variáveis12.

Os sujeitos deste estudo foram oito das doze enfermeiras que trabalham no CTQ do Hospital Instituto Dr. José Frota (IJF), localizado no município de Fortaleza, CE. Este é um hospital de referência em todo país para tratamento dos estágios da queimadura. Vale ressaltar que as enfermeiras excluídas da pesquisa estavam de férias, licença saúde no momento da coleta de dados, óbito no período da pesquisa, como também houve uma que se recusou a participar como sujeito do estudo.

A equipe de enfermagem da referida unidade é composta por enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, acadêmicos de enfermagem e mais recentemente por enfermeiros residentes da Residência Integrada em Saúde. As enfermeiras trabalham em regime de plantao (diurno e/ou noturno) atendendo a vítimas de queimaduras em todas as etapas de cuidado durante as 24 horas de funcionamento da instituiçao.

O CTQ, como um hospital de referência, realiza tratamentos de média e alta complexidade com tempo de permanência dos pacientes em média de 20 dias. Cerca de 100 profissionais, entre médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, psicólogos, psiquiatras, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, entre outros, formam uma equipe multidisciplinar para melhor assistir os pacientes. Sao realizados diariamente serviços ambulatoriais, de internaçao e de emergência que funcionam 24 horas.

Como instrumento de coleta de dados, optou-se por um roteiro de entrevista composta por perguntas semiestruturadas, que foram gravadas em áudio conforme autorizaçao dos entrevistados e posteriormente transcritas. O roteiro possuía as seguintes indagaçoes: O que você entende de educaçao em saúde? Quais as contribuiçoes que a educaçao em saúde traz para o cuidado? Existem estratégias para se colocar em prática a educaçao em saúde? Você coloca em prática a educaçao em saúde no centro de tratamento de queimados? Qual a frequência?

A coleta de dados ocorreu nos meses de fevereiro e março do ano de 2016. A entrevista foi aplicada de forma particular e em ambiente reservado no próprio local de trabalho dessas profissionais. Para preservar o anonimato das participantes, foram atribuídos códigos de acordo com a ordem da realizaçao das entrevistas, sendo: E1, E2, E3...E8.

A interpretaçao das falas foi realizada por meio da Análise Temática. A mesma consiste em descobrir as essências de sentidos que compoem uma comunicaçao cuja presença ou constância signifiquem algo para o objeto pretendido. A Análise Temática se divide em três fases operacionais:

1) Pré-análise: inclui a escolha dos documentos a serem analisados, a retomada dos objetivos e a elaboraçao de indicadores para a interpretaçao final. Nesta fase, determina-se a palavra-chave ou frase, a delimitaçao do contexto de compreensao, os recortes, a forma de categorizaçao, a modalidade de codificaçao e os conceitos teóricos mais gerais que orientarao a análise;

2) Exploraçao do material: consiste basicamente na transformaçao dos dados brutos, visando alcançar a essência de compreensao do texto. Nesta fase, faz-se o recorte do texto, depois se escolhem as regras de contagem e posteriormente realiza-se a classificaçao e a agregaçao dos dados, definindo as categorias que dirigirao a especificaçao dos temas;

3) Tratamento dos resultados obtidos e interpretaçao: realiza-se inferências e intepretaçoes de acordo com o quadro teórico dos estudos12.

Após a análise da temática por meio de unidades de significados e do processo de categorizaçao, surgiram três temáticas essenciais, sendo elas: Percepçao do enfermeiro sobre Educaçao em Saúde; Educaçao em Saúde: Contribuiçoes para o cuidado em queimadura e Estratégias para Implementaçao da Educaçao em Saúde no Contexto Hospitalar. As categorias foram descritas e depois discutidas com base na literatura pertinente ao tema.

Atendendo às questoes éticas e legais vinculadas à pesquisa, contidas na Resoluçao 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, foi solicitada a autorizaçao ao Comitê de Ética em Pesquisa do cenário do estudo. Cabe ressaltar que o projeto teve a sua aprovaçao no referido comitê, sob número de parecer 1.267.459. Além disso, os sujeitos foram esclarecidos quanto ao seu anonimato, sua participaçao voluntária, uso de pseudônimos, e ao mínimo de riscos pessoais, mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.


RESULTADOS

Quanto à categorizaçao das oito participantes, todas eram do sexo feminino, lotadas no CTQ e um tempo médio de 15 anos de exercício na profissao de enfermeira, sendo todas servidoras públicas. Em relaçao à titulaçao, especialistas (8), mestre (1 - em curso) e doutora (1).

A partir do método de análise temática e de acordo com as informaçoes obtidas por meio das entrevistas realizadas às enfermeiras, foram delimitadas três categorias essenciais, apresentadas e discutidas a seguir com as respectivas subcategorias: Percepçao do enfermeiro sobre Educaçao em Saúde; Educaçao em Saúde: Contribuiçoes para o cuidado em queimadura; Estratégias para Implementaçao da Educaçao em Saúde no Contexto Hospitalar.

Percepçao do enfermeiro sobre Educaçao em Saúde

Essa categoria representa a percepçao das enfermeiras frente à prática da educaçao em saúde no ambiente hospitalar. As participantes relataram, como exemplificado a seguir, o que elas entendem por educaçao em saúde no desenvolvimento de um trabalho efetivo e de qualidade para todos os envolvidos.

" Entendo como orientaçao, comunicaçao, informaçao do serviço que está sendo realizado ou orientaçoes acerca da prevençao em saúde." (E1)

" É você ter um preparo educacional voltado para a saúde. Tudo você precisa de conhecimento, a prática, a vivência com o paciente lhe traz conceitos dos procedimentos no momento do atendimento. Você está sempre ensinando a educar, no fazer, no realizar." (E2)

Na percepçao de que a educaçao e saúde sao fatores interdependentes e que trazem como resultado uma transformaçao na qualidade de vida, E3, em uma de suas falas, ressalta algo relevante que é:

" Educaçao e saúde caminham juntas porque uma depende da outra. Quanto mais educaçao melhor será sua saúde. A educaçao modifica seu estilo de vida, que como consequência melhora a saúde." (E3)

Os enfermeiros destacam o quao é relevante o educar para a saúde, para a transformaçao das atitudes e ganhos na qualidade de vida, destacando a educaçao em saúde, como:

" (...) atividade que você faz com o paciente que vai influenciar na modificaçao dos seus conhecimentos e das atitudes e na melhoria da qualidade de vida." (E4)

" É uma troca de informaçoes que ocorre por meio da interaçao do enfermeiro com o paciente e por meio dela busca-se que o paciente consiga compreender seu processo saúde-doença (...)." (E6)

Percebe-se que o contexto de educaçao em saúde é tomado como uma prática inerente à assistência e vem se tornando cada vez mais essencial no cotidiano do profissional. É interessante perceber a preocupaçao das participantes investigadas em incluí-la em sua rotina, visto as falas apresentadas por elas:

" (...) Diariamente a gente está se atualizando como educador em saúde." (E5)

" (...) você passa o conhecimento da prática diária a outras pessoas, usuários ou funcionários." (E7)

" É a maneira que você tem de orientar o paciente, de tirar algumas dúvidas deles (...)." (E8)

É notável que as enfermeiras participantes dessa pesquisa inserem a educaçao em saúde no seu processo de trabalho, mesmo que de forma pontual e nao necessariamente com a criaçao de espaços para discussao ou grupalizaçao. É importante ressaltar aqui também o esforço delas em colocar em prática o processo educativo durante o atendimento, mesmo diante das inúmeras atividades de assistência e gerenciamento.

Educaçao em Saúde: Contribuiçoes para o Cuidado em Queimaduras

Nesta categoria, as participantes relataram as contribuiçoes da prática educativa, a qual era atribuída por orientaçoes, destacando, como objetivo, facilitar o processo de entendimento do cuidado prestado e na hospitalizaçao, da admissao até a alta, bem como a inserçao do acompanhante em todo processo saúde-doença.

Durante toda coleta de dados, verificaram-se vários momentos em suas falas que destacaram as contribuiçoes das açoes educativas na assistência ao queimado:

" O paciente ou acompanhante bem informado acerca do tratamento que será realizado compreenderá melhor e com certeza vai ajudar em sua recuperaçao." (E1)

" (...) minimizar as úlceras por pressao, minimizar as posturas viciosas principalmente com os queimados, minimizar as dores, precisa ser abordado desde da entrada do paciente até sua alta." (E4)

Os discursos apresentados pelas seguintes participantes refletem a perspectiva de que se faz importante o conhecimento da condiçao de saúde durante a hospitalizaçao para promover o autocuidado, o que interfere diretamente no tempo de internaçao:

" Pode contribuir no processo do entendimento do que é a hospitalizaçao tanto pro paciente quanto para o acompanhante (...) durante todo processo de internaçao, desde o momento que o paciente adentra no ambiente até a saída dele do hospital, a educaçao em saúde é uma estratégia para ele tentar compreender esse processo saúde-doença." (E6)

" Contribui no tempo de internaçao. Se a gente nao esclarece o que vai ser feito, o procedimento a ser realizado, ele nao contribui para sua recuperaçao, prolongando o tempo de internaçao." (E8)

Para que as açoes educativas contribuam no processo de trabalho da enfermagem, faz-se necessário que o enfermeiro use de artifícios para se colocar a educaçao em saúde em prática no momento da entrada do paciente no ambiente hospitalar até sua alta, tendo em vista o contexto em que se está inserido e as suas necessidades de saúde. Além disso, os pacientes bem norteados acerca dos cuidados instituídos colaboram no período de hospitalizaçao, o que vem a colaborar nos procedimentos e, consequentemente, a reduzir o tempo de internaçao.

Estratégias para Implementaçao da Educaçao em Saúde no Contexto Hospitalar

As estratégias para implementaçao da educaçao em saúde apontadas pelas entrevistadas foram o atendimento individual e as atividades realizadas em grupo. Dessa forma, uma parcela das participantes destacou como estratégia principal para a implementaçao da educaçao em saúde nas suas práticas diárias o atendimento individual, como exemplificado a seguir:

" A estratégia vem desde conhecer o paciente, sua história para traçar a conduta do atendimento particular (...)." (E2)

" Na nossa prática, na visita leito-a-leito com o paciente, no ambiente ambulatorial quando ele vem para atendimento, buscar algum momento pra estar orientando esse paciente." (E6)

Destacou-se a importância da realizaçao de palestras ou na formaçao de grupos, mesmo que em menor frequência, para repassar orientaçoes inerentes aos procedimentos e tratamento, o qual facilitaria a aceitaçao da hospitalizaçao, como também, ouvir as queixas em relaçao aos atendimentos e equipe, uma vez que traz satisfaçao ao paciente e/ou acompanhante, como o recorte exemplifica:

" Juntamente com a psicóloga fazíamos palestras com os acompanhantes (...)." (E1)

" É na conversa, de forma individual e às vezes em grupo junto com o serviço social." (E3)

" Nas visitas a gente deve fazer o acompanhamento, as reunioes diárias ou semanal junto com outros profissionais. Orientando e procurando saber as queixas em relaçao ao serviço, em relaçao à equipe(...). Saber ouvir e saber explicar sobre cirurgias, banho anestésico, etc (...)." (E5)

O atendimento individualizado destacou-se como uma estratégia básica utilizada para prática da educaçao em saúde no contexto hospitalar, sendo usada em favor da promoçao da educaçao em saúde no âmbito hospitalar, uma vez que essa depende da relaçao entre profissionais e usuários, bem como do vínculo formado entre os mesmos.


DISCUSSAO

O enfermeiro tem-se mostrado como um potencial disseminador da educaçao em saúde no âmbito hospitalar. No entanto, a forma como essa prática vem sendo inserida mostra a necessidade de discussao para promover mudanças na assistência.

As açoes educativas desenvolvidas durante a assistência permitem trazer olhares diferenciados ao trabalho do profissional enfermeiro, posto que estas açoes podem transformar o ambiente hospitalar, considerados por muitos, frio e técnico, em um local mais humanizado, modificando a própria realidade4.

O estudo revela que as enfermeiras em seus discursos valorizam de forma significativa as atividades educativas desenvolvidas no ambiente hospitalar. Contudo, as observaçoes permitem destacar que as mesmas atuam de forma pontual, em atendimento individualizado e no leito, enfatizando o tratamento instituído.

O educar para a saúde consolida-se no trabalho da enfermagem por meio de açoes educativas, destacando os enfermeiros como mediadores no processo ensino-aprendizagem, fundamental para a promoçao da saúde. Desta maneira, o enfermeiro possui uma prática fortemente ligada às intervençoes educativas, objetivando a recuperaçao, a prevençao e as necessidades de saúde do paciente8.

Nesse sentido, o processo educativo visa desenvolver nas pessoas o compromisso com a sua própria saúde, sendo um importante meio que possibilita orientar o paciente sobre os cuidados especiais determinados pela sua condiçao de saúde. Assim, tem-se em vista a continuidade do tratamento, o retorno a suas atividades diárias e a reduçao de complicaçoes que estao associadas, muitas vezes, ao desconhecimento dos seus cuidados13.

Frente aos achados, identificou-se que as enfermeiras, dentre as diversas atividades desenvolvidas no seu cotidiano, demonstram desconhecer a importância das práticas pedagógicas no contexto hospitalar. Mesmo realizando-a durante a assistência, elas a colocam em prática da maneira e no momento que lhes convém.

Sendo a prática educativa considerada um instrumento de socializaçao de conhecimentos e de promoçao da saúde, suscita contribuiçoes para o atendimento ao paciente queimado. Uma vez que envolve troca de conhecimentos e possibilita mudanças nos processos de trabalho e no modo de produzir saúde, contribui na valorizaçao da autonomia, autoestima e autoconfiança, capaz de modificar posturas e atitudes14.

Dentre as contribuiçoes destacadas, identificadas pelas próprias participantes, surgiram aspectos como as explicaçoes a respeito dos procedimentos de enfermagem a serem realizados, como também sobre limpezas cirúrgicas, enxertias, alimentaçao específica de acordo com as necessidades fisiológicas e a importância de se evitar posturas viciosas, devido às contraturas desenvolvidas pela limitaçao do movimento causado da queimadura. Foi constatado que o paciente recupera sua autoestima e autoconfiança, colaborando com o tratamento e as rotinas durante sua internaçao.

Dessa maneira, uma forma de estimular os pacientes portadores de queimaduras a compreender e aceitar o tratamento dado a eles durante sua internaçao é a utilizaçao da educaçao em saúde, já que esta assume papel importante no processo do cuidar promovendo a aprendizagem e influenciando no empoderamento da sua condiçao de saúde14.

É importante destacar que no decorrer do estudo as participantes ressaltaram que a figura do acompanhante no processo de tratamento e recuperaçao do paciente mostrou-se relevante pelo fato de que ao estarem bem informados quanto ao tratamento colaboram minimizando as dúvidas e angústias nesse processo de internaçao.

Um dos estudos relembra o quanto é importante a inclusao do acompanhante nesse processo por possibilitar a criaçao de vínculo e a corresponsabilizaçao no cuidado, além de permitir a valorizaçao de conhecimentos e a busca de soluçoes a partir das necessidades de saúde apresentadas13.

Em um dos momentos do estudo, as participantes destacaram também as estratégias para implementaçao da educaçao em saúde no contexto hospitalar. Porém, o que se percebeu foi que a criaçao dos espaços para discussao ou a formaçao de grupo foram deixados para um segundo momento. Destacando, assim, o atendimento individualizado como uma das estratégias predominantes.

Dentre as estratégias sugeridas para implementaçao da educaçao em saúde no ambiente hospitalar, destaca-se a criaçao de espaços de conversaçao, por meio da fala e escuta qualificada e da contínua interaçao nas unidades de trabalho, para garantir a discussao de temáticas que sejam importantes aos usuários, como também para prepará-los para enfrentar seus problemas de saúde15.

A atividade educativa bem planejada é fundamental para a promoçao, reabilitaçao e manutençao da saúde do paciente. A interdisciplinaridade e uma padronizaçao da açao educativa favoreceriam sua efetivaçao e promoveriam a qualidade da açao educativa na assistência de enfermagem no processo de hospitalizaçao14.

Algumas das participantes destacaram que a atuaçao multidisciplinar na rotina do atendimento queimado mostrou-se efetiva pela possibilidade de recuperaçao física, psicológica e social o mais breve possível. No que diz respeito à psicologia, é incontestável seu acompanhamento nesse momento tao difícil e crucial da vida do paciente, já que a queimadura gera sentimentos de dor, ansiedade e medo. Já em relaçao ao serviço social, os direitos sociais, tanto do paciente quanto do acompanhante, sao garantidos durante o tempo de internaçao.

No contexto das práticas de educaçao em saúde no âmbito hospitalar, a comunicaçao destacou-se um fator potencial na interaçao entre profissionais, pacientes e acompanhantes, que na grande maioria das vezes sao seus familiares. Tornando, assim, a assistência mais humanizada, reduzindo as dúvidas e afliçoes existentes no processo de hospitalizaçao16.


CONCLUSAO

O presente estudo permitiu analisar a percepçao das enfermeiras em um hospital de referência em atendimento a queimados e quanto às açoes de educaçao em saúde desenvolvidas no processo de trabalho. Os sujeitos da amostra percebem a educaçao em saúde como uma articulaçao entre educaçao e saúde que busca uma melhor aceitaçao do tratamento, como também, diminuir ou até mesmo sanar os medos e afliçoes presentes durante a hospitalizaçao, considerando as experiências e saberes de todos os envolvidos no processo educativo.

Ao analisar o trabalho exercido no ambiente hospitalar, as participantes do estudo destacam a importância de inserir, de forma consistente, a educaçao em saúde na instituiçao, valorizando sua relevância em toda a rede de saúde. Contudo, as observaçoes permitem afirmar que os mesmos nao a colocam em prática de forma rigorosa, atuando mediante orientaçoes pontuais e em atendimentos individuais, existindo a necessidade de organizaçao e preparo das açoes educativas a serem desenvolvidas junto aos pacientes e/ou acompanhantes.

O processo educativo bem desenvolvimento é o resultado de açoes planejadas e organizadas, baseadas na rotina do atendimento aos pacientes queimados, trazendo informaçoes claras e concisas a respeito de procedimentos, alimentaçao, necessidade de acompanhante no período de internaçao, até informaçoes relacionada à pós-alta. Informaçoes estas que impactam no estado de saúde do paciente, visto que ele torna-se cooperativo no atendimento instituído, influenciando na reduçao do tempo de internaçao.

Diante dos resultados encontrados e das açoes educativas desenvolvidas no CTQ, torna-se necessário ressaltar que as práticas educativas devem ser planejadas tanto pela equipe como pelos gestores, a fim de sensibilizá-los quanto a sua magnitude, bem como, quanto aos avanços que esta pode promover na qualidade da assistência hospitalar.


REFERENCIAS

1. Takejima ML, Netto RFB, Toebe BL, Andretta MA, Prestes MA, Takaki JL. Prevençao de queimaduras: avaliaçao do conhecimento sobre prevençao de queimaduras em usuários das unidades de saúde de Curitiba. Rev Bras Queimaduras. 2011;10(3):85-8.

2. Institute for Health Metrics and Evaluation. The Global Burden of Disease: 2010 Update. IHME, Seattle: Institute for Health Metrics and Evaluation; 2012 [Citado 2016 Out 10]. Disponível em: https://vizhub.healthdata.org/gbd-compare/

3. Borges MCLA, Ponte KMA, Queiroz MVO, Rodrigues DP, Silva LMS. Práticas educativas no ambiente hospitalar: reflexoes sobre a atuaçao do enfermeiro. Rev Pesq Cuid Fundam. 2012;4(3):2592-7.

4. Rosa J, Faccin C, Dalegrave D, Argenta C, Fransciscatto LHG. Açoes educativas de assistência em enfermagem em ambiente hospitalar: a atençao a pais e familiares de neonatos em fototerapia. Rev Enferm. 2012;8(8):154-65.

5. Pennafort VPS, Silva ANS, Queiroz MVO. Percepçoes de enfermeiras acerca da prática educativa no cuidado hospitalar a crianças com diabetes. Rev Gaúcha Enferm. 2014;35(3):130-6.

6. Rigon AG, Neves ET. Educaçao em saúde e a atuaçao de enfermagem no contexto de unidades de internaçao hospitalar: o que tem sido ou há para ser dito? Texto Contexto Enferm. 2011;20(4):812-7.

7. Pereira FM, Barbosa VBA, Vernasque JRS. A experiência da educaçao permanente como estratégia de gestao com os auxiliares de enfermagem. Rev Min Enferm. 2014;18(1):228-35.

8. Rigon AG, Neves ET. As matrizes das concepçoes de educaçao em saúde de enfermeiros no contexto hospitalar. Rev Enferm UERJ. 2012;20(5):631-6.

9. Couto IRR, Marins DS, Santo FHE, Neves PS. Saber e pratica: a educaçao em saúde como elo facilitador no processo de cuidar. Rev Pesq Cuid Fundam (Online). 2013;5(1):3485-92.

10. Brasil. Ministério da saúde. Secretaria de Atençao à Saúde. Política Nacional de Humanizaçao. 1a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2013.

11. Brasil. Ministério da saúde. Secretaria de atençao à saúde. Departamento de Açoes Programáticas e Estratégias. Caderno Humanizasus. Atençao hospitalar. Série B. Textos básicos de saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.

12. Minayo MCS. O Desafio do conhecimento. Pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. Sao Paulo: Hucitec; 2014.

13. Jacobi CS, Silva RS, Magnago TSBS, Prochnow A, Noal HC, Beuter M. Contribuiçoes de açoes extensionistas de educaçao em saúde no pós-operatório de cirurgias traumatológicas. Rev Enferm Cent-Oeste Min. 2013;3(1):605-11.

14. Castro ANP, Lima Júnior EM. Desenvolvimento e validaçao de cartilha para pacientes vítimas de queimaduras. Rev Bras Queimaduras. 2014;13(2):103-13.

15. Silva MAM, Pinheiro AKB, Souza AMA, Moreira ACA. Promoçao da saúde em ambientes hospitalares. Rev Bras Enferm. 2011;64(3):596-9.

16. Aguiar ASC, Mariano MR, Almeida LS, Cardoso MVLML, Pagliuca LMF, Rebouças CBA. Percepçao do enfermeiro sobre promoçao da saúde na Unidade de Terapia Intensiva. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(2):428-35.


Artigo desenvolvido a partir do Trabalho de Conclusao de Residência 'Percepçoes da equipe de enfermagem acerca da prática da educaçao em saúde em um centro de tratamento de queimados realizado no Hospital Instituto Dr. José Frota e apresentado à Escola de Saúde Pública do Ceará, 2016.









Recebido em 26 de Agosto de 2016.
Aceito em 17 de Outubro de 2016.

Local de realização do trabalho: Centro de Tratamento de Queimados do Hospital Instituto Dr. José Frota, Fortaleza, CE, Brasil.

Conflito de Interesses: Os autores declaram não haver.


© 2024 Todos os Direitos Reservados