No mundo todo, estudos mostram que 11 milhões de pessoas são afetadas por queimaduras anualmente, resultando em cerca de 180.000 mortes e uma morbidade significativa. As sequelas físicas decorrentes das queimaduras podem ser metabólicas, musculoesqueléticas ou neurológicas, e muitas delas são permanentes. Os efeitos psicossociais incluem transtorno de estresse pós-traumático, causado pela própria lesão ou por intervenções dolorosas repetidas. Quadros de depressão e ansiedade ocorrem com frequência, e as cicatrizes podem afetar muitos aspectos da saúde psicossocial. Os pacientes que sobrevivem ao trauma das queimaduras, seus cuidadores e suas famílias geralmente encontram barreiras para interações sociais, reintegração e desempenho cotidiano normal. Internações hospitalares prolongadas, apoio por equipe multidisciplinar e reabilitação são comumente necessárias, o que representa um grande ônus econômico.

As queimaduras afetam países de baixa e média renda de forma desproporcional, com 70% das queimaduras mundiais ocorrendo nessas áreas. As taxas de mortalidade são até dez vezes maiores nesses países do que em outros contextos, e o acesso a cuidados especializados é frequentemente inadequado. Em países sem acesso universal à saúde, o custo do tratamento de queimaduras geralmente ultrapassa as possibilidades dos pacientes e de suas famílias, e pode exceder significativamente o limite máximo de gastos com saúde para os pacientes. Para enfrentar esses desafios, evidências científicas são necessárias para embasar o tratamento, para garantir uma abordagem baseada em evidências, e para direcionar as políticas de saúde. Apesar dos efeitos clínicos e psicossociais sobre os pacientes e custos com saúde, há uma escassez de pesquisas de alta qualidade nesta área, o que resulta na ausência de consenso sobre os melhores tratamentos para queimaduras. Essa escassez de pesquisas contribui para a grande disparidade e ausência de padronização nos atendimentos. Priorizar as áreas de pesquisa de maior importância para as partes envolvidas é uma maneira de abordar as questões de desigualdade. O financiamento da pesquisa pode então ser direcionado para áreas de maior interesse de pacientes e médicos.

Existem várias estratégias para identificar as prioridades de pesquisa. A "James Lind Alliance" (JLA) é uma iniciativa sem fins lucrativos com sede no Reino Unido que desenvolveu um método robusto e validado para colocar as partes interessadas no centro da priorização da pesquisa. O Instituto Nacional de Pesquisa em Saúde e Cuidados do Reino Unido financia a infraestrutura da JLA para supervisionar o processo de parcerias de definição de prioridades. Este processo foi concluído para mais de 150 condições clínicas, e tem gerado impacto em pesquisa e assistência. O método JLA inclui a opinião de pacientes, cuidadores e profissionais de saúde de forma igualitária, em um procedimento de consulta padronizado para determinar quais perguntas sem resposta e incertezas de tratamento são mais importantes para eles. Esses exercícios de definição de prioridades são geralmente conduzidos dentro de um país. Todavia, considerando o efeito global das queimaduras e a desigualdade no acesso a cuidados de boa qualidade, é importante garantir que a pesquisa se concentre nas necessidades dos pacientes sobreviventes de queimaduras e dos profissionais de saúde em todo o mundo.

O objetivo da parceria de definição de prioridades "Priorities in Global Burns Research" da JLA foi identificar as dez principais prioridades de pesquisa em nível mundial no tratamento de queimaduras térmicas que são mais importantes para pacientes, cuidadores e profissionais de saúde.

Ao longo de dois anos, foram conduzidas duas pesquisas online multilíngues com pacientes, cuidadores e médicos, 16 entrevistas e um workshop virtual de definição de prioridades para identificar e priorizar questões para pesquisa. As respostas da pesquisa foram recebidas de participantes de 88 países. Uma lista de 19 prioridades de pesquisa foi classificada em um workshop online com a participação de 28 pessoas (14 profissionais de saúde, dez pacientes queimados e quatro cuidadores) de 15 países para produzir as dez prioridades de pesquisa finais, que estão demonstradas na Tabela 1.

Essas dez prioridades representam oportunidades para pesquisadores, financiadores e profissionais de saúde abordarem questões importantes no tratamento de queimaduras em nível global. Parcerias anteriores de definição de prioridades da JLA direcionaram pesquisas futuras em condições clínicas e os autores preveem que essas prioridades possam ter um efeito semelhante na pesquisa, na prática e nas políticas de saúde, com o potencial de melhorar o tratamento de queimaduras em todo o mundo.

REFERÊNCIA

1. Richards HS, Staruch RMT, Kinsella S, Savovic J, Qureshi R, Elliott D, et al. Top ten research priorities in global burns care: findings from the James Lind Alliance Global Burns Research Priority Setting Partnership. Lancet Glob Health. 2025;13(6):e1140-e1150. DOI: 10.1016/S2214-109X(25)00059-2