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Artigo Original

Estudo experimental comparativo entre diferentes curativos à base de prata em queimaduras de 2º grau em ratos

Comparative experimental study between different silver-based dressings in 2nd degree burns in rats

Décio Luis Portella1; Luciana Canabarro2; Marli Gerenutti3

DOI: 10.5935/2595-170X.20240015

RESUMO

INTRODUÇÃO: As queimaduras representam um desafio significativo para a saúde pública e para os cuidados médicos, devido ao risco de complicações e à necessidade de um tratamento adequado.
OBJETIVO: Avaliar histopatologicamente as feridas de segundo grau por escaldo em ratos, após diferentes tratamentos à base de prata.
MÉTODO: Foram utilizados 45 ratos Wistar, divididos em grupos tratados com soro fisiológico, sulfadiazina de prata, carboximetilcelulose com prata (Aquacel®), espuma de polietileno associada à prata (Mepilex®) e prata nanocristalina (Actcoat®). A área queimada foi enviada para análise histopatológica, sendo avaliados: epitelização; extensão da área cicatrizada; infiltrado inflamatório crônico; neoformação vascular; proliferação fibroblástica, fibras elásticas e colágeno jovem. Foi atribuída uma nota conforme maior intensidade na lâmina histológica.
RESULTADOS: A análise estatística mostrou significância para neoformação vascular (p<0,043), infiltrado inflamatório (p<0.004) e fibras elásticas (p<0,001). A presença de infiltrado inflamatório foi maior nos tratados com sulfadiazina de prata e com Actcoat® do que nos tratados com Mepilex® (p=0,035 e p=0,019, respectivamente). As fibras elásticas foram maiores nos grupos Actcoat® e sulfadiazina de prata com relação ao controle (p<0,001 e p=0,047) e maiores no grupo Actcoat® do que no grupo Aquacel® (p=0,005). As feridas apresentaram-se epitelizadas entre o 9º e 12º dia. Grupo controle exibiu menor resposta inflamatória, menor presença de neoformação vascular e a presença de fibras elásticas.

CONCLUSÕES: A presença de fibras elásticas foi maior quando a prata esteve presente, já o tratamento com curativo a base de soro fisiológico não foi agressivo ao tecido lesado.

Palavras-chave: Queimaduras. Bandagens. Prata.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Burns represent a significant challenge to public health and medical care due to the risk of complications and the need for appropriate treatment.
OBJECTIVE: Histopathologically evaluate second-degree scald wounds in rats, after different silver-based treatments.
METHODS: 45 Wistar rats were used, divided into groups treated with saline, silver sulfadiazine, carboxymethylcellulose with silver (Aquacel®), polyethylene foam associated with silver (Mepilex®) and nanocrystalline silver (Actcoat®). The burned area was sent for histopathological analysis, where the following were evaluated: epithelialization; extension of the healed area; chronic inflammatory infiltrate; vascular neoformation; fibroblastic proliferation, elastic fibers and young collagen. A grade was assigned according to the highest intensity on the histological slide.
RESULTS: Statistical analysis showed significance for vascular neoformation (p<0.043), inflammatory infiltrate (p<0.004) and elastic fibers (p<0.001). The presence of inflammatory infiltrate was greater in those treated with silver sulfadiazine and Actcoat® than in those treated with Mepilex® (p=0.035 and p=0.019, respectively). Elastic fibers were greater in the Actcoat® and silver sulfadiazine groups compared to the control (p<0.001 and p=0.047) and were greater in the Actcoat® group than in the Aquacel® group (p=0.005). The wounds appeared to be epithelialized between the 9th and 12th day. Control group exhibited less inflammatory response, less presence of vascular neoformation and the presence of elastic fibers.
CONCLUSIONS: The presence of elastic fibers was greater when silver was present, whereas treatment with a saline-based dressing was not aggressive to the injured tissue.

Keywords: Burns. Bandages. Silver.

INTRODUÇÃO


Queimaduras são lesões resultantes da transferência de energia de uma fonte de calor para o corpo e, quando atingem grandes extensões, além do dano local, podem causar repercussões sistêmicas graves. Este trauma permanece como importante problema público de saúde, frequente em nosso meio e oneroso ao sistema, uma vez que demanda internações prolongadas, múltiplos procedimentos cirúrgicos e curativos1.


A incidência de queimaduras graves é uma das principais causas de morte por lesões não intencionais em todo o mundo. Elas geralmente ocupam o quarto lugar entre todas as causas de trauma, ficando atrás de acidentes de trânsito, quedas e afogamentos. As queimaduras podem ser particularmente devastadoras devido à extensão das lesões na pele e em outros tecidos, que podem causar complicações como infecções, perda de fluidos2.


Apesar de causarem mais de 300.000 mortes/ano em todo o mundo, a grande maioria das queimaduras não são fatais. Entretanto, estão entre as principais causas de sequelas físicas e problemas psicológicos que esses pacientes enfrentam, principalmente em países pobres e em desenvolvimento onde, além das condições de vida precárias, o acesso às unidades de tratamento é limitado3.


No Brasil, as queimaduras graves, embora não apresentem um impacto significativo nas estatísticas de mortalidade geral da população, têm um efeito marcante na morbidade, porém ocorrem hospitalizações, interrupções prolongadas e tratamentos complexos, muitas vezes envolvendo várias cirurgias, exercícios de pele e reabilitação, além de impactar o sistema de saúde, gerando custos elevados e demandando recursos especializados4.


As queimaduras da pele são classificadas quanto à sua profundidade em: primeiro, segundo e terceiro graus e sua magnitude salienta a importância de um tratamento e atendimento médico especializado para cuidados especiais, pois a pele humana pode tolerar, sem prejuízo, temperaturas de até 44ºC. Acima deste valor, são produzidas lesões de diferentes comportamentos, em que o grau de lesão está diretamente relacionado à temperatura e ao tempo de exposição5.


O tratamento de pacientes queimados envolve diversas abordagens, sendo a antibioticoterapia sistêmica e a promoção da epitelização fundamentais para prevenir infecções e minimizar danos funcionais e estéticos. As infecções são uma das principais complicações em pacientes com queimaduras graves, pois a perda de integridade da pele expõe o corpo a uma maior vulnerabilidade a agentes patogênicos6.


A antibioticoterapia sistêmica é usada para tratar e prevenir infecções, especialmente em casos em que há risco de septicemia. Além disso, o processo de epitelização, que é uma regeneração da pele, é promovido para acelerar a cicatrização e reduzir a necessidade de intervenções cirúrgicas mais complexas6.


O controle rigoroso de infecções também inclui medidas como o uso de curativos especiais, controle da temperatura ambiente, desbridamento, além de monitoramento contínuo do paciente. Essas práticas visam não apenas a preservação da função e estética, mas também a prevenção de complicações graves, como a septicemia, que é uma das principais causas de morte entre pacientes com queimaduras extensas6.


O tratamento empregado em pacientes queimados é o antibioticoterapia sistêmica e a epitelização, prevenindo infecções e reduzindo os danos funcionais e estéticos, além de controle de infecções na tentativa de se evitar a septicemia7.


O uso da quimioterapia tópica tem sido fundamental nesse sentido e tem ajudado a melhorar a sobrevivência de pacientes com queimaduras graves, minimizando a incidência de sepse8,9.


Uma das estratégias para combater a ameaça de infecção bacteriana da ferida é o uso de agentes antimicrobianos de metais nobres, dos quais o mais prevalente é a prata10.


Atualmente, curativos à base de prata são rotineiramente usados para o tratamento de queimaduras, mas fortes evidências de sua ação sobre a epitelização permanecem mal definidas. No Brasil, nas unidades de tratamentos de queimados, estão disponíveis curativos como: a sulfadiazina de prata (o mais usado e barato), malha de polietileno associada à prata nanocristalina, espuma de poliuretano associado à prata e hidrofibra de carboximetilcelulose associada à prata. Apesar das muitas opções disponíveis, não há claras evidências científicas que justifiquem o uso de um curativo específico11.


Dessa forma, verifica-se a necessidade de maiores estudos sobre os aspectos cicatriciais em lesões pós-queimadura frente à escolha e utilização de diferentes curativos pela equipe médica em unidades de queimados11.


Objetivo


Avaliar histopatologicamente as feridas de segundo grau por escaldo em ratos, após diferentes tratamentos à base de prata.


 


MÉTODO


Foram utilizados 45 ratos Wistar (Rattus norvegicus albinus) adultos, machos, com aproximadamente 80 dias, pesando entre 230 e 260g, os quais foram acondicionados em local apropriado com controle e registro de temperatura (22ºC±2ºC) e umidade (45%±15%).


Os animais foram ambientados no Biotério de Farmacologia da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em Sorocaba, recebendo ração e água.


Os animais foram divididos e mantidos em gaiolas individuais, devidamente protegidas da ação direta da luz (lâmpadas frias), com ciclos de 12/12h de claro e escuro.


O estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Animal da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). Aprovado pelo CEUA/ULBRA (protocolo 2011-54P).


Para a indução das lesões, os animais foram pesados e anestesiados através de bloqueio neuromuscular prévio à execução da queimadura, sendo utilizados o cloridrato de cetamina (anestésico geral na dose de 100mg/Kg) e o cloridrato de xilazina (relaxante muscular na dose de 6mg/Kg).


Os animais foram divididos em cinco grupos experimentais. Para a realização do experimento, os animais foram epilados no dorso com área de 3x3cm e, imediatamente, foram colocados em contato com água a 70ºC por 10 segundos. Este método produziu queimaduras de 2º grau nos dois grupos. Após 30 minutos, deu-se início ao tratamento da queimadura através da administração de fármacos tópicos por meio de curativos com período de trocas variável.


Grupos experimentais: 1. Solução Fisiológica 0,9% (Grupo Controle) - troca a cada 3 dias; 2. Creme de Sulfadiazina de Prata a 1% (Dermazine®, Silvestre Laboratório Química e Farmacêutica Ltda) - troca diária; 3. Espuma macia hidrofílica de poliuretano revestida com uma camada de contato de silicone (Mepilex® Ag, Mölnlycke Health Care) - troca a cada 3 dias; 4. Hidrofibra de carboximetilcelulose associado à prata (Aquacel® Ag, ConvaTec) - troca a cada 3 dias; 5. Malha de Polietileno (dupla camada) de alta densidade impregnada com prata nano cristalina, com uma camada de gaze rayon/polyester no meio (Acticoat®, Smith&Nephew) - troca a cada 3 dias. Os demais curativos foram trocados com o animal em estado vigil, sem a necessidade de sedação ou analgesia. Os mesmos foram fixados ao animal com malha tubular com ação analgésica, permitindo um maior conforto ao animal (Figura 1).


Após o período de 24 dias com avaliações diárias, foram sacrificados no 1º, 2º, 4º, 6º, 9º, 12º, 18º, 21º e 24º dia, em séries de 5 ratos (um de cada grupo), com dose letal de tiopental sódico; sendo dissecada a pele da área queimada, 5µm de espessura, acondicionada em frascos com solução de formaldeído 10% e as amostras encaminhadas para análise histopatológica e montadas em lâminas.


Toda a análise foi realizada no Serviço de Patologia da Pontifícia Universidade Católica de SP, em Sorocaba. A análise foi realizada seguindo os critérios de avaliação: 1) epitelização; 2) extensão da área cicatrizada; 3) infiltrado inflamatório crônico; 4) neoformação vascular; 5) proliferação fibroblástica, 6) fibras elásticas e 7) colágeno jovem. Para cada critério avaliado, foi atribuída uma nota (de 0 a 5) conforme a sua maior intensidade na lâmina histológica, com pontuação de 0 (nenhuma representação), 1 (até 20% do aspecto avaliado), 2 (20 a 40%), 3 (40 a 60%), 4 (60 a 80%) e 5 (>80%).


O registro fotográfico de todas as lâminas histológicas foi realizado por análise de imagem do software NIS Elements AR - Advanced Research®. Foram aferidos parâmetros de avaliação da cicatrização, conforme as notas atribuídas variando de 0 (pior situação) a 5 (melhor situação) para cada parâmetro, verificando as diferenças entre os parâmetros de cicatrização avaliados entre os grupos de tratamento e controle.


 


RESULTADOS


Os animais submetidos ao processo de queimadura exibiram características semelhantes, não apresentaram infecções graves no local onde ocorreu a queimadura. Alguns animais apresentaram pequenas áreas com características infecciosas e sinais logísticos nas bordas da área queimada de diferentes curativos utilizados, devido à movimentação do rato e provável deslocamento do curativo. No entanto, mesmo nessas áreas a cicatrização foi o evento final. As feridas apresentaram-se cicatrizadas entre o 9º e 12º dia, sem preponderância de um curativo específico nas feridas avaliadas, conforme a Figura 2.


A Figura 3 mostra a proporção entre área corpórea e área queimada (3x3cm2 em vermelho). A queimadura provocada em nosso no experimento (9cm2) equivale a 2,1% da área corpórea do animal, conforme a equação:



Através das análises de microscopia foram avaliados parâmetros considerados relevantes para a comparação das lesões causadas pela queimadura, tratadas com os diferentes curativos: Epitelização; Infiltrado inflamatório; Extensão da área cicatrizada; Neoformação vascular; Proliferação fibroblástica; Fibras elásticas e Colágeno jovem.


Foi possível verificar que a maioria das lesões apresentaram variações desde a epiderme até casos em que a necrose se estendeu à derme profunda, apresentados na Figura 4.


Na Figura 4A, área circulada em vermelho mostra a presença discreta de infiltrado inflamatório nas amostras tratadas com soro fisiológico.


As demais amostras tratadas com curativos à base de prata apresentaram maior intensidade de células inflamatórias.


A extensão da lesão foi semelhante em todos os grupos, com lesão de espessura parcial da derme.


Comparando-se a Figura 4G, que foi a espessura epitelial mais encontrada, com a Figura 4H, amostra isolada com maior espessura, nota-se uma diferença de mais 55µm.


Experimento: Comparação entre notas atribuídas para cada tratamento à base de prata


Os gráficos representam as notas médias atribuídas a cada parâmetro estudado dentro dos grupos, independentemente do dia de evolução. O Gráfico 1 mostra notas à área de cicatrização bastante semelhantes entre os grupos.


 



 


O Gráfico 2 e a Tabela 1 mostram que os ratos do grupo controle e do grupo Aquacel® apresentaram menores notas de neoformação vascular.


 



 


 



 


O Gráfico 3 indica que não houve diferenças nas notas de proliferação de fibroblastos entre os grupos.


 



 


O Gráfico 4 e a Tabela 2 mostram menor nota de infiltrado inflamatório no grupo controle e grupo tratado com Mepilex® em relação aos outros grupos.


 



 


 



 


O Gráfico 5 e a Tabela 3 mostram maiores notas de fibras elásticas nos ratos tratadas com Actcoat®.


 



 


 



 


Observa-se pelo Gráfico 6 que os ratos tratados com Actcoat® apresentam maior nota de epitelização.


 



 


Não há diferença estatisticamente significante entre as notas atribuídas a presença de colágeno jovem entre os grupos como é apresentado pelo Gráfico 7.


 



 


A Tabela 4 mostra que as notas médias aos parâmetros de neoformação vascular, infiltrado inflamatório e fibras elásticas diferem estatisticamente entre os grupos de tratamento (p<0,05); para os demais parâmetros não há diferença média estatisticamente significativa nas notas atribuídas entre os grupos (p>0,05).


 



 


A Tabela 5 mostra que, apesar da diferença média estatisticamente significativa nas notas de neoformação vascular entre os grupos (p=0,043) (Tabela 1), não foi possível identificar qual grupo difere dos demais, mas sugere que os ratos tratados com sulfadiazina de prata apresentam maior nota média que os ratos tratados com Aquacel® (p=0,073). As notas médias de infiltrado inflamatório foram estatisticamente maiores nos ratos tratados com sulfadiazina de prata e com Actcoat® do que nos ratos tratados com Mepilex® (p=0,035 e p=0,019, respectivamente). Já as notas médias para as fibras elásticas foram estatisticamente maiores nos grupos Actcoat® e sulfadiazina de prata com relação ao controle (p<0,001 e p=0,047) e foram em média estatisticamente maiores no grupo Actcoat® do que no grupo Aquacel® (p=0,005).


 



 


DISCUSSÃO


Os pacientes que sofrem queimaduras apresentam um largo espectro de gravidade nas lesões, dependendo da profundidade da ferida e a área de superfície do corpo afetada. Esta variabilidade nas lesões torna difícil descrever com precisão o número de pessoas que sofrem a cada ano com queimaduras, pois apenas as mais graves são internadas em hospitais e estes são os casos menos comuns12.


Os primeiros cuidados dispensados às vítimas de queimadura são de fundamental importância no êxito final do tratamento, pois contribuem para a redução da morbidade e da mortalidade. Nesse sentido a literatura está repleta de ensaios clínicos que mostram muitos materiais disponíveis para tratar queimaduras, entre eles, os benefícios da terapêutica com prata sobre a cicatrização, através de sua eficácia antimicrobiana13.


Os efeitos dos produtos à base de prata sobre a cicatrização de feridas variam significativamente, e essa variação está ligada às características e formulações de cada produto. Compreender essas diferenças é crucial para selecionar o tratamento mais adequado, levando em consideração a especificidade de cada tipo de ferida14.


A utilização de curativos biossintéticos parece ter alguns benefícios sobre outros produtos no tratamento de queimaduras, pois é possível observar diminuição do tempo de cura e redução da dor durante as trocas, estabelecendo benefícios referentes ao tempo de epitelização das feridas o mais rápido possível, a fim de prevenir a infecção, sequelas funcionais e estéticas, tornando o tratamento mais eficaz15.


Neste trabalho foram utilizados quatro tipos diferentes de curativos, sendo possível verificar vantagens e desvantagens entre eles. Subjetivamente, o Mepilex® Ag apresentou a mais fácil aplicação e remoção; o creme de sulfadiazina de prata e Aquacel® Ag necessitaram discreta remoção mecânica. Da mesma forma, Mepilex® Ag apresentou melhor absorção do que Aquacel® Ag. Quanto ao Acticoat®, foi de fácil aplicação e remoção, mas impregnou a ferida com algumas áreas prateadas; além disso, os ratos apresentaram-se mais agitados com este curativo, podendo corresponder a algum incômodo.


Já os animais que receberam o curativo com gaze embebida em soro fisiológico apresentaram uma coloração mais escura, mas nenhum deles apresentou infecção na área queimada ou qualquer infecção à distância.


O aspecto infiltrado inflamatório foi avaliado nos 45 animais dos diferentes grupos. Todos apresentaram aumento estatisticamente significativo, sendo menor no grupo tratado com soro fisiológico e maior no grupo do Acticoat®. Isso contradiz a literatura, pois os curativos à base de prata causaram maior infiltrado inflamatório.


Correlacionando os grupos avaliados, foi possível observar que não apresentaram qualquer alteração comportamental ou perda de apetite; porém, mesmo não realizando avaliação com exames laboratoriais hepáticos, as queimaduras foram de pequena extensão (2,1% da superfície corporal) e por curto período de tratamento, não comprometendo o metabolismo nem a imunidade do animal. Portanto, o processo cicatricial pode ser avaliado independentemente de alterações sistêmicas. Todas as feridas (incluindo o grupo controle) apresentaram-se cicatrizadas, umas mais cedo e outras mais tarde, entre o 9º e o 12º dia.


Observando que a epitelização das queimaduras de espessura parcial superficial, neste trabalho, foi o evento final comum, não foi possível comprovar qualquer diferença nos 45 animais avaliados no presente estudo que, invariavelmente, apresentaram completa epitelização entre o 9º e o 12º dia.


Apresentaram melhor aspecto geral, no dia da remoção, que os curativos com soro, pois este apresentou maior quantidade de fibrina na gaze removida. Aquacel® e Mepilex® apresentaram adequada absorção de exsudatos da ferida, promovendo um aspecto subjetivo de limpeza sem fibrinas. O Acticoat®, de aspecto semelhante a um papel, não apresentou fácil maleabilidade na manipulação e capacidade absortiva como Aquacel® e Mepilex®, deixando o local da ferida com aspecto prateado.


Também foi possível avaliar o colágeno na cicatrização das feridas dos animais, não apresentando diferenças estatisticamente significativas entre os grupos. No entanto, a presença de fibras elásticas foi positiva e mais significativa com o uso de Acticoat®.


Dessa forma, a prata no tratamento de feridas e queimaduras de espessura parcial vem sendo apresentada e utilizada ao longo do tempo em todo o mundo, pois apresenta agentes antimicrobianos tópicos, proporcionando melhor tratamento para prevenir infecções e, consequentemente, sendo a melhor escolha para reduzir os riscos de sepse16.


A escolha dos curativos e a aplicação de antimicrobianos em pacientes com queimaduras variam amplamente entre os diferentes centros de tratamento, dependendo dos recursos financeiros disponíveis e da tecnologia acessível, além da condição econômica do paciente. Essa variabilidade tem impacto direto na qualidade do cuidado oferecido, o que pode influenciar os resultados clínicos17.


 


CONCLUSÕES


Os efeitos dos diversos produtos disponíveis à base de prata sobre a cicatrização de feridas são variáveis e compreender as características dos diversos produtos permite uma utilização mais adequada de acordo com a necessidade específica de cada ferida.


Nesse experimento foi possível observar que as queimaduras de espessura parcial e pequena área corporal lesada epitelizam, independentemente da utilização de curativos à base de prata, pois a epitelização é o evento final.


O tratamento apenas com soro fisiológico não é agressivo ao tecido lesado, apresentando infiltrado inflamatório discreto e promovendo a epitelização da mesma forma que os demais curativos.


Não foi possível observar qualquer diferença no colágeno frente aos diferentes tratamentos, mas a presença de fibras elásticas foi maior quando a prata esteve presente; porém, novos estudos são necessários.


 


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Recebido em 14 de Novembro de 2024.
Aceito em 11 de Janeiro de 2025.

Local de realização do trabalho: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde, Sorocaba, SP, Brasil.

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.


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