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Artigo Original

Termografia como método de avaliação das lesões de pele por queimaduras

Infrared thermographic image as a tool for evaluating skin lesions caused by burns

Flávia Gagliano Guergoleti1; Maria Elena Echevarría-Guanilo2; Mara Cristina Nishikawa Yagi3; Susany Franciely Pimenta4; Elisangela Flauzino Zampar5; Daiane Mendes Ribeiro6; Rosangela Aparecida Pimenta-Ferrari7

DOI: 10.5935/2595-170X.20230016

RESUMO

OBJETIVO: Analisar a evolução das lesões de pele por queimaduras por meio de imagem termográfica infravermelha e 2D.
MÉTODO: Estudo observacional, prospectivo, realizado no Centro de Tratamento de Queimados de um hospital universitário público do estado do Paraná com os pacientes com lesões de pele por queimaduras, admitidos entre agosto e setembro de 2022. A coleta de dados foi realizada por meio do prontuário eletrônico para caracterização sociodemográfica e clínica, entrevista, aferição da temperatura e umidade ambiente, captura da imagem (2D) com celular Samsung A51® e termografia infravermelha com câmera termográfica FLIR ONE Pro®, das lesões de pele por queimaduras durante a realização do 1º curativo (24h) e do segundo curativo (entre 48h e 72h).
RESULTADOS: Predominaram pacientes do sexo masculino (64,1%), faixa etária de 18 a 59 anos (59%), da cor branca (62,5%), e o local do acidente foi domiciliar (69,2%), sendo a escaldadura com líquidos superaquecidos (46,2%) o principal agente causal. Para 92%, a superfície corporal queimada < 20% e 59,1% evoluiu para o enxerto. À captura da imagem termográfica infravermelha, observou-se que as lesões de evoluíram para epitelização apresentavam temperaturas maiores, média de 31,99ºC, quando comparadas às lesões que necessitaram de enxerto, média de 31,92ºC e, estas, por sua vez, temperaturas maiores em relação às que necessitaram de amputação do membro, média de 31,18ºC.
CONCLUSÕES: A termografia infravermelha apresenta-se como um método complementar eficaz na avaliação da profundidade das lesões de pele por queimaduras, indicando precocemente as características da lesão, contribuindo na conduta mais assertiva.

Palavras-chave: Termografia. Queimaduras. Tecnologia em Saúde. Atenção à Saúde. Enfermagem.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To analyze the evolution of skin lesions caused by burns using infrared and 2D thermographic images.
METHODS: Observational, prospective study carried out at the Burn Treatment Center of a public University Hospital in the state of Paraná with patients with skin lesions due to burns, admitted between August and September 2022. Data collection was performed using the electronic medical record for sociodemographic and clinical characterization, interview, measurement of ambient temperature and humidity, digital image capture (2D) with a Samsung A51® cell phone and infrared thermography with a FLIR ONE Pro® thermographic camera, of skin lesions due to burns during the performance of the first dressing (24h) and the second dressing (between 48h and 72h).
RESULTS: There was a predominance of male patients (64.1%), aged between 18 and 59 years (59%), white (62.5%), and the accident site was home (69.2%), with scalding with superheated liquids (46.2%) being the main causal agent. For 92%, the burned body surface < 20% and 59.1% evolved to the graft. The capture of the infrared thermographic image, it was observed that the lesions that evolved to epithelialization, had higher temperatures, average of 31.99ºC, when compared to the lesions that needed graft, average of 31.92ºC and, these, in turn, higher temperatures than those that required limb amputation, mean of 31.18ºC.
CONCLUSIONS: Infrared thermography is an effective complementary method for assessing the depth of skin lesions caused by burns, indicating the characteristics of the lesion at an early stage, contributing to a more assertive conduct.

Keywords: Thermography. Burns. Health Technology. Delivery of Health Care. Nursing.

INTRODUÇÃO


As queimaduras são lesões resultantes de trauma de origem térmica decorrente da exposição ou contato com chamas, líquidos superaquecidos, eletricidade, frio, substâncias químicas, radiação, atrito ou fricção, que ocorrem na pele ou outros tecidos corporais, podendo originar alterações locais ou sistêmicas, com destruição parcial, total ou comprometer os tecidos adjacentes. A extensão dos danos está relacionada à temperatura do agente, à concentração de calor e à duração do contato1.


Segundo a Organização Mundial da Saúde, a queimadura é o quarto tipo de trauma mais comum no mundo, ficando atrás apenas da violência interpessoal, quedas e acidentes de trânsito2. Em países de baixa e média renda como o Brasil, as queimaduras tornaram-se uma das principais causas de morbimortalidade, sendo uma entidade traumática bastante presente em todos os grupos sociais3.


A profundidade de uma queimadura determina o curso da cicatrização, a necessidade de cirurgia e a morbidade associada à lesão. Sendo assim, a profundidade é um critério importante na definição do tratamento de queimaduras4,5. Queimaduras de profundidade indeterminada são um desafio de diagnóstico e tratamento, sendo este termo utilizado em casos de queimaduras de espessura parcial mais profundas com um potencial de cura desconhecido. Em tais feridas, espera-se que a cicatrização possa ocorrer em 2 a 3 semanas4.


É importante diferenciar as queimaduras que cicatrizam dentro de 14 dias após a ocorrência da queimadura. Estas raramente causam cicatrizes e podem ser tratadas de forma conservadora, e as queimaduras que cicatrizam com mais de 21 dias, de forma geral, resultam em cicatrizes hipertróficas e requerem tratamento cirúrgico. A superestimação da gravidade da queimadura pode resultar em cirurgia desnecessária, enquanto a subestimação pode levar ao atraso cirúrgico e a um risco aumentado de cicatrizes hipertróficas. Os especialistas em queimaduras estimam a gravidade da ferida avaliando especificamente cada caso a depender das características visuais e táteis da lesão6.


Uma medição mais assertiva da gravidade da queimadura poderia fornecer aos profissionais uma ferramenta complementar para avaliar com maior precisão e agilizar o tratamento definitivo para acelerar a recuperação e a reabilitação do paciente7. Até o momento, a avaliação da profundidade da queimadura é feita por meio da avaliação subjetiva, visual, pela equipe médica especialista ou não em tratamento de pessoas que sofreram queimaduras, sendo esta avaliação considerada padrão-ouro; assim, depende da experiência e do julgamento pessoal do profissional8.


Algumas ferramentas objetivas, como a termografia, podem auxiliar na avaliação das queimaduras por meio da diferença de temperatura da pele entre queimaduras de espessura parcial e total, devido à perfusão vascular na derme lesada nesta última, possibilitando identificar com precisão áreas com queimaduras superficiais que poderiam cicatrizar de forma espontânea, e aquelas com queimaduras profundas que precisam de enxerto de pele, numa fase inicial9.


Constata-se, no Brasil, a escassez de estudos que identifiquem o potencial de uso da termografia na avaliação do processo de cicatrização de lesões de pele, sobretudo, o uso desta na avaliação de lesões por queimaduras. Lopes et al.10 identificaram a correlação das imagens termográficas com os sinais clínicos de pessoas com úlceras de membros inferiores, evidenciando as características termográficas com redução de temperatura observadas em pessoas com doença arterial obstrutiva periférica e outras condições sistêmicas que prejudicavam a perfusão. Já o aumento de temperatura se mostrou como indicativo de um processo inflamatório ou infeccioso.


 


OBJETIVO


O presente estudo tem como objetivo analisar a evolução das lesões de pele por queimaduras por meio da imagem termográfica infravermelha e imagem digital 2D.


 


MÉTODO


Trata-se de um estudo com abordagem quantitativa, do tipo observacional prospectivo. Desenvolvido no Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) de um hospital universitário público localizado em um município da região norte do estado do Paraná, Sul do Brasil.


O CTQ foi inaugurado em agosto de 2007, é uma unidade de referência e recebe pacientes de todas as faixas etárias. A estrutura física é constituída por pronto-atendimento, dez leitos de enfermaria, seis leitos de Unidade Terapia Intensiva (UTI), duas salas cirúrgicas, uma sala de balneoterapia, ambulatório e uma sala de oxigenoterapia hiperbárica.


A população de estudo foram todos os pacientes com lesões de pele por queimaduras admitidos para cuidados do Centro de Tratamento de Queimados e que permaneceram internados no CTQ, Unidade de Terapia Intensiva de Queimados (UTQ), Pronto-Socorro (PS), Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTI Ped) e Pediatria, conforme regulação dos leitos pelo Núcleo Interno de Regulação (NIR).


Foram incluídos todos os pacientes admitidos no período de 1 de agosto a 30 de setembro de 2022, com diagnóstico de queimaduras de 2º e 3º grau, independentemente da idade e do agente causal. Não foram incluídos pacientes internados no pós-operatório de enxerto e pacientes com tatuagens no local da queimadura, devido à interferência dos compostos da tinta na imagem termográfica.


Foi utilizado um instrumento para coleta de dados com informações sobre caracterização com as seguintes variáveis demográficas: sexo (masculino, feminino), faixas etárias da pesquisa, subdividida em quatro subgrupos: (≤11 anos, 12 a 17 anos, 18 anos a 59 anos e ≥ 60 anos), raça (branca, negra, parda e indígena), escolaridade (ensino fundamental, médio e superior), situação conjugal, com companheiro ou sem companheiro. Quanto às variáveis clínicas: circunstância do acidente (doméstico, de trabalho, em via pública, entre outros); local da queimadura, grau das lesões, SCQ (superfície corporal queimada), agente etiológico, conforme instrumento de coleta de dados.


Foi realizada pela pesquisadora a mensuração das condições da pele perilesional utilizando o equipamento Skin Up®, um dispositivo portátil que permite a avaliação da umidade e elasticidade cutânea por bioimpedância. O objetivo de utilização deste dispositivo foi a avaliação da umidade, oleosidade e elasticidade da pele circundante à lesão, considerando que são fatores que podem alterar a avaliação da temperatura pela termografia, assim como favorecer o processo de cicatrização.


As imagens digitais foram capturadas com um aparelho celular da marca Samsung®, modelo A51, câmera de 48Mp, e armazenadas em uma pasta individual, em computador específico para a pesquisa e identificadas com as iniciais do participante, seguindo os preceitos éticos da pesquisa com seres humanos e suas definições com relação a confidencialidade e anonimato. A câmera utilizada para captura das imagens termográficas foi FLIR ONE Pro LT® Pro-Grade Câmera Termo visora para celular Android com Conector Micro USB, Resolução 4800 Pixel.


A coleta de dados foi realizada em dois momentos, durante o primeiro curativo do paciente ao ser admitido no CTQ independentemente do tempo decorrido da queimadura até a internação e, posteriormente, no próximo curativo subsequente, variando de 24 a 72 horas, a depender do curativo utilizado como cobertura da lesão no primeiro atendimento.


Antes da coleta de dados propriamente dita, foi realizado um pré-teste, com três pacientes, totalizando cinco lesões.


São eles: J.D.S., 79 anos, que sofreu queimadura do tórax por chama direta; M.B.S.J., 5 anos, queimadura com água fervendo; F.A.G.R., 37 anos, queimadura elétrica com lesões no abdome, tórax e membro superior esquerdo, para avaliar os instrumentos para a coleta de dados e as condições ambientais que poderiam interferir na coleta.


A coleta de dados foi realizada na sala de balneoterapia, onde o paciente foi submetido à sedação e analgesia por um anestesista para troca do curativo, e em alguns casos na sala cirúrgica após a abertura do curativo, antecedendo o procedimento cirúrgico.


Antes da captura da imagem, todas as luzes do ambiente foram acesas, com exceção do foco cirúrgico e as portas foram fechadas, reduzindo-se a corrente de ar. Utilizando um termo-higrômetro foi mensurada a temperatura e umidade do ambiente antes de cada coleta de imagens


Embora existam recomendações com relação ao controle da temperatura, que deve variar de 22 a 23ºC, controle da umidade de 40 a 50%7,11, neste estudo não houve essa possibilidade, uma vez que, por se tratar de paciente grande queimado e a coleta ter sido realizada durante o procedimento de balneoterapia, muitas vezes as condições recomendadas não foram atingidas, entretanto, foram controladas, com a finalidade de poderem ser analisadas como possíveis fatores de confusão.


Após a sedação do paciente e abertura dos curativos, o cirurgião plástico plantonista realizou o preenchimento do diagrama de Lund e Browder, especificando as áreas queimadas e a profundidade de cada área por meio da avaliação clínica, e a mensuração da extensão da queimadura. Essa avaliação do cirurgião plástico foi registrada na ficha de coleta de dados pela pesquisadora, tanto no paciente adulto quanto no pediátrico.


Após a limpeza da área queimada, com água corrente aquecida por meio de um chuveiro elétrico e clorohexidina 2%, foi realizada a secagem com compressas estéreis e aguardado o tempo de 5 minutos com o intuito de recuperação da temperatura, antes do início da coleta.


Conforme evidências já produzidas, antes da captura de imagem termográfica, tomaram-se os seguintes cuidados: higienização da lesão com soro fisiológico 0,9% ou clorexidina 0,5%, neste último caso, procedeu-se ao enxague para retirar resíduos, remoção de flictenas, tecidos necróticos e resquícios de coberturas, espera de secagem natural da lesão ou procedeu-se à secagem com gaze estéril6,7. Todos esses cuidados foram adotados e fizeram parte dos passos pré-determinados.


Foram realizados os registros das imagens digitais, seguindo os seguintes passos: 1) Aspectos éticos e direito de imagem, solicitando autorização ao paciente; 2) Identificação do paciente e da ferida, deixando o paciente na melhor posição; 3) Limpeza da ferida – com SF 0,9% – e remoção de tecidos necróticos; 4) Ângulo de distância – respeitar um ângulo de 90º, com distância aproximada de 90cm e outra com 45cm; 6) Uso de zoom, flash e iluminação – se necessário pode-se utilizar o zoom, porém não recomenda-se flash, sendo a iluminação o mais natural possível; 7) Tipo de câmera – o tipo de câmera não influencia na foto, porém câmeras com melhores resoluções apresentam melhor qualidade; 8) Registro de informações – após o registro fotográfico, é importante registrar o nome do paciente, características da ferida, distância, ângulo; e 9) Repetir o procedimento.


Repetir os mesmos passos do procedimento permite melhores comparações futuras. A distância entre a câmera e a lesão apresenta variações conforme diferentes estudos, variando entre 30cm12, 70cm11 e de 50 a 100cm13.


Após o registro da imagem digital, foi realizada a captura da imagem termográfica, sendo que para cada lesão de pele por queimadura foi realizada captura da imagem térmica por três vezes consecutivas, tentando manter sempre a captura da temperatura alvo na mesma localização.


Como diversos fatores podem influenciar na temperatura14, orienta-se que realizar a repetição da aferição é algo que deve ser considerado, principalmente havendo suspeita de alterações patológicas como infecções.


Nesta pesquisa foi realizada a avaliação posterior do desfecho do processo de cicatrização, no caso se a lesão evoluiu para uma epitelização espontânea ou necessitou de intervenções como desbridamento e enxerto, bem como a anotação do desfecho do paciente, se ele foi a óbito ou teve alta hospitalar.


Os dados foram digitados e tabulados pela pesquisadora principal, no programa Microsoft Excel for Windows e analisados pelo programa SPSS (Statical Package for Social Sciences) na versão 20.0. A análise exploratória dos dados foi realizada com estatística descritiva. O teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov foi utilizado para verificar se a distribuição de probabilidade do conjunto de dados pode ser aproximada pela distribuição normal, visto que n>50. As hipóteses testadas ao aplicar o teste consistem na hipótese nula (H0.: A amostra segue uma distribuição normal a um alfa p>0,05) e alternativa (H1: A amostra não segue uma distribuição normal a um alfa p≤0,05). Constatou-se a normalidade dos dados, por meio da aplicação do Kolmogorov-Smirnov, sendo que os valores de alfa p foram maiores do que 0,05 (não rejeitando, portanto, H0).


Para a análise de confiabilidade dos dados, foi utilizado o coeficiente alfa de Cronbach, o qual fornece uma medida razoável de confiabilidade em um único teste. Dessa forma, não são necessárias repetições ou aplicações paralelas de um teste para a estimativa da consistência dele. O valor alfa mínimo aceitável é 0,70; abaixo desse valor, a consistência interna da escala utilizada é considerada baixa. Em contraste, o valor máximo esperado é 0,90; acima deste valor pode ser considerado redundante ou sobreposto. Em geral, os valores alfa entre 0,80 e 0,90 são os preferidos15.


Para a coleta de dados, foi apresentada ao paciente ou responsável legal a finalidade da pesquisa e a forma como ela se desenvolveria e, após, a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e do termo de autorização do uso de imagens na pesquisa.


A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina, sob o parecer número: CAAE: 55216421.0.0000.5231. Todos os participantes assinaram o TCLE e quando necessário o Termo de Consentimento de participação da pessoa como informante, e o Termo de autorização do uso de imagem e depoimento.


 


RESULTADOS


Durante os 2 meses em que foi realizada a pesquisa, houve a internação no CTQ de 39 pacientes aptos a participar do estudo, sendo que alguns apresentavam múltiplas lesões e destes foi possível avaliar 93 lesões de pele por queimaduras de diferentes etiologias e períodos de cicatrização.


Em relação à caracterização sociodemográfica (Tabela 1), dos 39 pacientes acompanhados durante o estudo, 64,1% eram do sexo masculino, 59% possuíam idade entre 18 e 59 anos, 62,5% de raça branca, 66,7% com ensino fundamental e 55,6% sem parceiro conjugal.


 



 


Já com relação à caracterização clínica da população com lesão de pele por queimaduras (Tabela 2), observou-se que o local do acidente com maior evidência foi no ambiente doméstico (69,2%), com agente causal de escaldo (46,2%), tendo menos de 20% da superfície corporal queimada (92,3%), sendo o tronco e os membros inferiores os mais acometidos, 35,9% e 33,3%, respectivamente. Quanto ao grau de profundidade da lesão, 43,6% segundo grau profundo, tendo uma evolução para enxerto (59,1%) e desfecho clínico de alta em 97,4% dos casos.


 



 


Com base nos resultados obtidos, o coeficiente de correlação intraclasse (ICC) indicou que há uma confiabilidade boa entre as temperaturas ICC=0,894 [IC 95%=0,856-0,925]; F (88, 440)=9,511; (p<0,001).


Conforme a Tabela 3, a correlação entre as variáveis temperatura e desfecho da lesão evidenciou que lesões que evoluíram para epitelização apresentaram média de temperaturas mais elevadas (M=31,94ºC na primeira coleta e 31,99ºC na segunda coleta), enquanto lesões mais profundas que necessitaram de enxerto, obtiveram médias de temperaturas termográficas menores (M=31,6ºC na primeira coleta e 31,92ºC na segunda coleta); já as lesões que epitelizaram e lesões cujo desfecho foi a amputação tiveram as menores temperaturas termográficas (M=30,46ºC na primeira coleta e 31,89ºC na segunda coleta).


 



 


A diferença entre o valor da amostra nas duas coletas se deve ao fato de que três pacientes tiveram alta antes da conclusão da segunda coleta.


Verificou-se que os resultados obtidos não apresentavam diferença estatisticamente significante entre as temperaturas e o desfecho da cicatrização, obtendo-se na primeira coleta o valor de p=0,151 e na segunda coleta p=0,484.


Apesar das temperaturas não apresentarem significância estatística com o desfecho, observou-se que houve variações a níveis inferiores das temperaturas de acordo com a gravidade da lesão.


Com relação ao controle das condições ambientais para a coleta de dados, a temperatura média do ambiente na primeira coleta foi de 24,5ºC (variação 21,3ºC a 27ºC) e na segunda coleta 24,4ºC (22,2ºC a 27,5ºC), e umidade média de 53,6% (44% a 64%) e 52,7% (41% a 64%), respectivamente.


 


DISCUSSÃO


Diversos estudos apontam que a termografia permite identificar as queimaduras mais profundas, pois apresentam menor temperatura e levam mais de 21 dias para cicatrizar, o que se deve principalmente à diminuição do metabolismo celular, resultando na diminuição da emissão de calor pelo tecido, que no termograma fica evidenciado pelas cores escuras. As queimaduras superficiais apresentam maior temperatura e cicatrizam em até 21 dias12,14,16,17.


Ganon et al.9 realizaram um estudo com 40 pacientes pediátricos, captando a imagem termográfica em três momentos distintos (T1: dia 1 ao dia 3 após a queimadura, - T2: dia 4 ao dia 7, - T3: dia 8 ao dia 10). O resultado primário do estudo foi a capacidade de prever a cicatrização completa da ferida após 15 dias, nos pontos de tempo T1, T2 e T3.


Por se tratar de um estudo realizado no único centro de referência para tratamento de pessoas queimadas fora da capital do estado do Paraná, existe uma fila de espera da central de regulação de leitos do estado. Por esta razão, a internação termina retardando a admissão do paciente no Centro especializado e, dessa forma, o paciente é admitido após vários dias da ocorrência da queimadura, o que pode interferir na precisão dos dados captados na admissão do paciente, pelo tempo prolongado da queimadura sem o tratamento adequado e pelo risco de infecção da lesão.


Foi realizado um estudo no Reino Unido por Goel et al.18, em que foram avaliados 45 pacientes adultos com queimaduras, apresentando entre 1-5 dias do acidente, fotografados com FLIR ONE e Image Laser Doppler. O potencial de cicatrização foi determinado comparando a ferida e a temperatura normal da pele através do FLIR ONE e as alterações do fluxo sanguíneo com o LDI. O potencial de cicatrização foi categorizado em cicatrização de feridas em menos e mais de 21 dias.


O tempo de coleta no presente estudo foi estipulado em apenas 2 momentos, pois, na maioria dos casos, os pacientes com queimaduras com profundidade de 2º grau profundo e 3º grau são encaminhados para a realização dos enxertos.


A termografia deve ser utilizada sempre levando-se em consideração alguns cuidados específicos: o tipo e resolução da câmera termográfica, condições ambientais, experiência do avaliador na utilização dos instrumentos de termografia, assim como, expertise na interpretação dos resultados e espaço físico para a utilização desta tecnologia19.


A imagem termográfica pode apresentar um problema de distorção na imagem causada pela perda de água por evaporação no leito da ferida. Este problema pode ser resolvido permitindo que a ferida seque completamente após a limpeza (o que pode atrasar o tempo da avaliação) ou aplicando uma cobertura não permeável no leito da ferida, o que elimina o problema da evaporação20.


Existem recomendações com relação ao controle da temperatura, que deve variar de 22 a 23ºC, controle da umidade de 40 a 50%7, porém levando-se em consideração que os pacientes que são admitidos em centros especializados muitas vezes são aqueles que apresentam lesões mais complexas, que não são possíveis de serem tratadas nos hospitais de origem, pela indisponibilidade de recursos e mão de obra qualificada, os curativos são realizados sempre dentro da balneoterapia com anestesia geral. O controle das condições ambientais ideais para a captura das imagens térmicas nem sempre é possível neste ambiente, devido à umidade maior nesse tipo de ambiente, onde é realizado o banho do paciente e a temperatura muitas vezes mais alta, visando evitar a hipotermia do paciente, que fica completamente exposto durante a realização do banho e posteriormente do curativo. Porém, as imagens captadas apresentaram relevância para complementar a avaliação clínica e apresentaram indícios da evolução da lesão.


De forma geral, a termografia infravermelha digital pode ser usada como um preditor independente de cicatrização de feridas, permitindo a avaliação da necessidade de tratamento ambulatorial, ou seja, cicatrização por reepitelização, ou cirúrgico, a exemplo de enxertia, desbridamento ou amputação, podendo ser utilizada por distintas especialidades e profissionais, mesmo estando distante dos centros especializados.


Por se tratar de um centro especializado de atendimento ao paciente queimado com número limitado de vagas, ocorre um atraso para o referenciamento do paciente, causando demora na admissão após o acidente, o que interfere na avaliação das lesões nos estágios iniciais da queimadura.


 


CONCLUSÕES


O presente estudo evidenciou que a temperatura termográfica média foi maior em lesões que cicatrizaram espontaneamente, ou seja, de segundo grau superficial, e menor em lesões que evoluíram com necessidade de enxerto ou até mesmo amputações, podendo ser utilizada como instrumento complementar no diagnóstico da profundidade das lesões de pele por queimaduras, evitando enxertos desnecessários e auxiliando na tomada de decisões mais assertivas e precoces no atendimento ao paciente queimado.


 


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Recebido em 12 de Junho de 2023.
Aceito em 11 de Julho de 2024.

Local de realização do trabalho: Universidade Estadual de Londrina, Departamento de Enfermagem, Londrina, PR, Brasil.

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.


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