1189
Visualizações
Acesso aberto Revisado por pares
Artigo Original

Perfil epidemiológico de crianças e adolescentes queimados internados em um hospital público de Goiânia

Epidemiological profile of burned children and adolescents hospitalized in a public hospital in Goiânia

Líbyna Thaynara Calandrelli Martins1; Lucieli Boschetti Vinhal2; Elizabeth Rodrigues de Morais3

RESUMO

OBJETIVO: Identificar o perfil epidemiológico de crianças e adolescentes queimados internados em um hospital público de Goiânia e verificar se há relação entre a superfície corporal queimada (SQC) e a redução de amplitude de movimento (ADM), necessidade de unidade de terapia intensiva (UTI), óbito e causa da queimadura.
MÉTODO: Este é um estudo transversal, foram coletados dados retrospectivos de indivíduos entre 0 e 17 anos que tiveram queimaduras e foram internados na enfermaria ou UTI, no período de janeiro de 2015 a dezembro de 2019.
RESULTADOS: A amostra foi composta por 55 pacientes, mediana de idade de 12,25 anos, com predomínio de adolescentes (72,7%) do sexo masculino (65,5%). As principais causas de queimaduras foram líquidos inflamáveis (32,7%), chamas diretas (29,1%) e escaldaduras (21,8%). As escaldaduras foram identificadas como o principal agente causal das queimaduras nas crianças, e os líquidos inflamáveis nos adolescentes (p<0,01). Houve prevalência de queimaduras de 2° grau (85,5%), 54,6% dos pacientes tiveram a SQC >20%, sendo os membros superiores (78,2%) e inferiores (61,8%) as regiões corporais mais acometidas, 40% precisaram de UTI e 29,1% necessitaram de ventilação mecânica (VM). A taxa de óbito foi de 5,5%. Desbridamento (89,1%) e enxertia (41,8%) foram os procedimentos cirúrgicos mais realizados. A maior SQC associou-se com a redução da ADM, necessidade de UTI e óbito (p<0,05).
CONCLUSÃO: As crianças de menor idade apresentaram queimaduras por escaldadura e os adolescentes foram mais propensos a se queimarem por líquido inflamável. A SQC associou-se com a redução da ADM, necessidade de UTI e óbito.

Palavras-chave: Queimaduras. Epidemiologia. Criança. Adolescente. Cuidados Críticos.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To identify the epidemiological profile of children and adolescents burnt in a public hospital of Goiânia, Brazil, and to verify if there is a relationship between the total body surface area (TBSA) and reduced range of motion (ROM), the need for intensive care unit (ICU), death and cause of the burn.
METHODS: This is a cross-sectional study, in which retrospective data was collected from burned individuals between 0 and 17 years hospitalized in the nursery or ICU from January 2015 to December 2019.
RESULTS: The sample consisted of 55 patients with, a median age of 12.25 years, with a predominance of adolescents (72.7%) and males (65.5%). The main causes of burns were flammable liquids (32.7%), direct flames (29.1%), and scalding (21.8%). Scalding was identified as the main causal agent in children, and flammable liquids in adolescents (p<0.01). There was a prevalence of 2nd-degree burns (85.5%), 54.6% of the patients had TBSA >20%, with the upper limbs (78.2%) and lower limbs (61.8%) the most affected body regions, 40% needed ICU and 29.1% needed mechanical ventilation. The death rate was 5.5%. Debridement (89.1%) and grafting (41.8%) were the most commonly performed surgical procedures. Higher TBSA was associated with reduced ROM, need for ICU, and death (p<0.05).
CONCLUSION: Younger children had scald burns and adolescents were more likely to be burnt by a flammable liquid. TBSA was associated with reduced ROM, need for ICU, and death.

Keywords: Burns. Epidemiology. Child. Adolescent. Critical Care.

INTRODUÇÃO

Apesar das inúmeras campanhas de prevenção, as queimaduras ainda são recorrentes em crianças e adolescentes1. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a falta de atenção de um adulto é considerado o principal fator de risco para queimaduras em crianças. Há, também, um grande número de casos de queimaduras provocadas por maus tratos infantis2. Já os adolescentes experimentam um rápido crescimento físico, psicossocial e cognitivo, que contribui para a formação de comportamento; essas ações podem proteger a sua saúde ou colocá-la em risco3.

O principal agente causador de queimaduras em crianças menores é a escaldadura, que ocorre em cozinhas domésticas2,4,5. Por outro lado, as crianças maiores e adolescentes são mais propensas a sofrerem queimaduras de contato com objetos quentes ou chamas6. Na primeira infância, as queimaduras têm uma ampla gama de consequências adversas a longo prazo, que variam de comprometimento funcional a implicações psicológicas7. Se a queimadura atingir 1 0% do corpo da criança, existe um risco elevado de mortalidade. Os efeitos fisiológicos vão depender da porcentagem corporal queimada, o que torna os efeitos sistêmicos significativos8. Isso ocorre devido à desproporção da superfície corporal em relação ao peso da criança, tornando esta afecção mais grave9.

O risco de mortalidade está relacionado ao risco de infecção, que pode evoluir com sepse e, consequentemente, com as complicações pulmonares e musculoesqueléticas9. As complicações pulmonares podem ser imediatas, o que ocorre na lesão por inalação do monóxido de carbono, já as complicações tardias podem ocasionar pneumonia e embolia pulmonar10.

As complicações musculoesqueléticas devem-se à presença de sequelas das queimaduras, decorrentes do processo de reorganização tecidual, que afetam a pele e os tecidos moles, incluindo as cicatrizes hipertróficas, contraturas e dor neuropática10. As queimaduras não fatais são uma das principais causas de morbidade em decorrência do processo de hospitalização prolongada, deficiências, cicatrizes e rejeição do enxerto2.

Diante das consequências, a curto e a longo prazo, das queimaduras, é importante para a população estudada, assim como para os órgãos públicos e trabalhadores da saúde, verificar o perfil epidemiológico dos pacientes. Compreender os fatores causais, tempo de internação, uso de ventilação mecânica, idade dos acometidos, gravidade, profundidade, superfície corporal queimada (SQC), entre outros fatores, é de extrema relevância para a formulação de protocolos de atendimentos mais eficientes e, consequentemente, contribui para uma melhor elaboração de medidas preventivas pelos órgãos competentes.

Desse modo, o presente estudo buscou identificar o perfil epidemiológico de crianças e adolescentes queimadas de um hospital público de Goiânia, GO, e verificar se há relação entre a SQC e a redução de amplitude de movimento (t), a necessidade de unidade terapia intensiva (UTI), óbito e causa da queimadura.


MÉTODO

Caracterização do estudo e do local de estudo


Este é um estudo transversal, com dados retrospectivos, realizado em um hospital estadual de urgências em Goiânia. Este estudo foi realizado segundo as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas envolvendo seres humanos (Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde). A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Goiás sob o número (4.242.128) e Comitê de Ética Leide das Neves Ferreira sob o número (4.262.997). O nome da instituição permanecerá em anonimato.

Amostra

A amostra foi composta por crianças e adolescentes atendidos na enfermaria e UTI pediátrica, no período de janeiro de 2015 a dezembro de 2019. A coleta de dados foi realizada nos meses de outubro de 2020 a janeiro de 2021 no sistema de prontuários eletrônicos do hospital. Foram incluídos na pesquisa prontuários de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, que sofreram queimaduras e estiveram internados, independentemente de ter sido em enfermaria ou Unidade de Terapia Intensiva. Foram excluídos do estudo os prontuários que não obedeceram ao critério clínico de queimadura, ano de internação e idade maior de 17 anos.

Para estabelecer a relação entre a idade e causa de queimadura, os participantes foram divididos em quatro subgrupos, segundo a faixa etária: lactentes (do nascimento ao primeiro ano de vida), pré-escolares (dos 2 aos 6 anos), escolares (dos 7 aos 9 anos) e adolescentes (faixa etária entre 10 e 17 anos). Já a SQC foi dividida em oito categorias: <5%; 5-10%; 10-15%; 15-20%; 20-25%; 2530%, 30-50% e >50%.

Instrumentos e procedimentos

Inicialmente, foi contatado o Serviço de Arquivo Médico do hospital para a identificação dos prontuários de crianças e adolescentes internados por queimadura no período de janeiro de 2015 a dezembro 2019. Os dados dos prontuários foram transcritos para um formulário de coleta de dados elaborada pelos pesquisadores, constando variáveis como: dados de identificação (nome, idade, sexo, procedência, nível de escolaridade, data de internação, data de alta hospitalar ou do óbito); agente causal, motivo da queimadura, superfície corporal queimada (SQC), profundidade da queimadura (1 °, 2°, 3° grau), região acometida, procedimentos realizados, necessidade de internação na unidade de terapia intensiva e de uso de ventilação mecânica, tempo de hospitalização, fisioterapia motora e respiratória, presença de limitações funcionais.

Análise dos dados

Os dados foram organizados em uma planilha e analisados pelo software Statistical Package for the Social Science (SPSS, v 23.0). Os dados foram apresentados por estatística descritiva pelas medidas de média, desvio padrão, frequência e porcentagem. Para análise inferencial, foi verificada normalidade pela aplicação do teste Kolmogorov Smirnov. Para estabelecer relação entre variáveis categóricas, utilizou-se o teste exato de Fisher, com um nível de significância de 5% (p<0,05).


RESULTADOS

Um total de 70 crianças e adolescentes de 0 a 17 anos foram admitidos na Enfermaria e UTI pediátrica vítimas de queimaduras.

Dos 70 prontuários identificados, 15 não atenderam aos critérios de inclusão, portanto, foram incluídos neste estudo 55 prontuários.

Em relação ao perfil sociodemográfico, observou-se que a faixa etária mais acometida por queimaduras foi a dos adolescentes, com média de idade de 12,25 anos, variando de 1 a 17 anos, sexo masculino, procedentes de Goiânia e região metropolitana. Em relação à escolaridade dos indivíduos, em 43,6% não foi relatada nos prontuários, entretanto, a maior média apresentou-se no ensino fundamental (Tabela 1).




Quanto às características clínicas da amostra, observou-se que houve uma média de dias de internação de 26 dias, com intervalo mínimo de 1 e máximo de 146 dias. Nesse período, 5,5% dos pacientes foram a óbito, houve prevalência de queimaduras causadas por líquido inflamável e chama direta, destacando-se os motivos álcool e líquido quente na cozinha. Apenas 45,4% tiveram queimaduras menores que 20% de SQC. Em relação à profundidade, as queimaduras de 2° grau foram as mais prevalentes, seguidas de queimaduras de 3° grau. As regiões mais acometidas foram, respectivamente, membros superiores, membros inferiores, tronco anterior, cabeça/ face (Tabela 2).




Em relação à necessidade de internação em UTI, 40% dos sujeitos internados precisaram, e desses apenas 29,1% necessitaram de ventilação mecânica (VM). O tempo de VM variou de 1 a 24 dias, sendo a média de dias de uso de 8,9. O desbridamento correspondeu a mais da metade dos procedimentos realizados, seguido da enxertia. A maioria dos pacientes realizou fisioterapia motora e respiratória e teve limitações funcionais, dentre elas, destacou-se a diminuição da amplitude de movimento (ADM), cicatrizes hipertróficas e hiperêmicas (Tabela 3).




Ao relacionar a causa da queimadura com a idade, observou-se que a escaldadura ocorreu com maior frequência nas crianças com menos idade e a queimadura por líquido inflamável nas maiores, sobretudo de 7 a 9 anos (p<0,01) (Tabela 4).




A maior SCQ teve associação com redução da ADM (p=0,01), com necessidade de UTI (p=0,001) e óbito (p=0,01). Não houve associação entre SCQ e as três principais causas de queimaduras (p>0,05) (Tabela 5).




DISCUSSÃO

As queimaduras são lesões que podem ser prevenidas. Nesse sentido, estudos epidemiológicos nacionais e internacionais são relevantes para a compreensão da causalidade e contribuem para promoção em saúde. O presente estudo analisou, em um período de 5 anos, o perfil epidemiológico de crianças e adolescentes queimadas em um hospital público de Goiânia e foi encontrado predomínio de adolescentes, ao contrário de outros estudos5,11 realizados com crianças e adolescentes nos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul, que encontraram predomínio de crianças em idade pré-escolar.

Quanto ao sexo, o masculino também foi mais prevalente, indo de acordo com o encontrado na literatura4,5,11. Em relação à procedência dos pacientes, observou-se que 56,4% eram oriundos de cidades do interior de Goiás e outros estados, o que também já foi encontrado em um estudo com pacientes que tiveram queimaduras e foram internados em um hospital público de urgência de Goiás12. Esse fato pode ser explicado pela baixa infraestrutura dos hospitais em cidades brasileiras do interior, necessitando a ida para as capitais, que contam com hospitais melhor equipados e especializados em queimaduras, para buscar tratamento.

Em relação à causa da queimadura, o líquido inflamável esteve relacionado com crianças nas maiores idades, sendo o álcool o principal agente causador. Em um estudo epidemiológico realizado nos Estados Unidos com crianças e adolescentes de até 18 anos, identificou-se que os adolescentes foram mais acometidos por chama direta, correspondendo a 53,8%13. Já o líquido quente foi associado no presente estudo com crianças menores, como em outros estudos brasileiros4,5. As crianças menores de 5 anos correm maior risco de sofrer queimaduras graves e as causas das queimaduras variam de acordo com as variáveis culturais, demográficas e socioeconômicas2.

Pressupõe-se que o sexo masculino tem uma maior predisposição para brincadeiras que envolvem maiores riscos e o fato de crianças menores estarem em pleno desenvolvimento neuropsicomotor relaciona-se com a intensa busca por estímulos sensoriais, observado pelo desejo de conhecer o ambiente14, portanto, os acidentes na cozinha surgem com frequência. Já os adolescentes, à medida que ganham independência e menos supervisão dos pais, tornam-se mais susceptíveis a se queimarem por chamas ou objetos quentes, visto que são mais ativos e podem provocar suas queimaduras, por meio de suas próprias escolhas e julgamento limitado1,6.

Com relação à SQC, 38,2% dos sujeitos apresentaram queimaduras maiores de 30%, o que vai de encontro aos estudos en-

volvendo crianças e adolescentes4,5, que encontraram queimaduras menores que 25%. Nesses estudos, predominaram crianças e o principal fator causal foi a escaldadura, diferentemente do presente estudo, cujo predomínio de queimaduras foi em adolescentes, devido ao manuseio de líquidos inflamáveis, como, por exemplo, o álcool. Assim, pode-se inferir que a gravidade das queimaduras está relacionada com a causa, o que pode ser um fator relevante na gravidade e mortalidade das queimaduras.

Quanto à profundidade das queimaduras, predominaram as de 2° grau, assim como demonstram alguns estudos4,5,14. As queimaduras de 2° grau tendem a evoluir para uma alteração na pigmentação da região afetada e se esse processo de cicatrização demorar mais de 3 semanas pode levar ao surgimento das cicatrizes hipertróficas6. As regiões mais acometidas na presente pesquisa foram, respectivamente, os membros superiores e inferiores, tronco anterior, cabeça/ face. Em outros estudos5,14 realizados com crianças e adolescentes que tiveram predomínio de lactentes e pré-escolares, o tronco foi a região mais afetada e a escaldadura foi identificada como principal fator causal. Uma possível explicação é o fato das crianças tenderem a puxar panelas com líquido quente para cima de si, o que pode ocasionar a escaldadura de membros superiores, tronco anterior e cabeça/face.

Na presente investigação, a necessidade de internação em UTI correspondeu a 40% da amostra, o que difere de um estudo4 realizado com crianças e adolescentes que encontrou uma taxa menor de internação na UTI, teve uma prevalência de crianças e como o fator causal mais incidente das queimaduras a escaldadura. As queimaduras causadas por líquido inflamável e chama direta representaram, respectivamente, 32,7% e 29,1%. Algumas pesquisas7,10 sugerem que a severidade das queimaduras também pode estar ligada com o fator causal, e que o mesmo influencia na SQC, e, consequentemente, aumenta o risco de infecções e complicações pulmonares e funcionais tardias.

Estudos epidemiológicos realizados nos Estados Unidos e nos Países Baixos13,15, países desenvolvidos, mostraram que a taxa de necessidade de internação em UTI e de VM em crianças e adolescentes queimadas é, consideravelmente, menor em relação ao Brasil. No entanto, em um estudo brasileiro16 com crianças e adolescentes, menores de 1 6 anos, em Porto Alegre, observou-se que a VM foi utilizada em 20,7% dos casos. Na presente análise, o uso de VM correspondeu a 29,1%, uma possível explicação é o fato de ter ocorrido maior acometimento de SQC, por isso, pode-se inferir que o mesmo seja fator determinante na severidade das condições clínicas dos pacientes, o que acarreta a necessidade da utilização de VM.

Os procedimentos que foram mais realizados foram o desbridamento e a enxertia, sendo o primeiro prevalente. O desbridamento tem por objetivo limpar a queimadura para diminuir o risco de infecção e é amplamente utilizado em queimaduras superficiais para evitar a necessidade de se realizar o enxerto6. Outros estudos4,5,13,14 também identificaram que o desbridamento, seguido da enxertia, foram os procedimentos cirúrgicos mais realizados.

As cicatrizes hipertróficas são decorrentes de queimaduras térmicas profundas e são capazes de ocasionar danos funcionais, dor e restrição funcional17. Entre as alterações funcionais, as cicatrizes hipertróficas foram a mais prevalente neste estudo, assim como identificado em um estudo realizado com pacientes pediátricos em Santa Catarina, correspondendo a 56,3%. Os autores encontraram uma correlação do surgimento de cicatrizes hipertróficas com a faixa etária de 6-12 anos, ambiente extradomiciliar, SQC maior que 30%, profundidade de 3° grau e agentes inflamáveis17. Nesse estudo, houve associação entre maior SQC com a redução da ADM, necessidade de UTI e óbito. Dessa maneira, infere-se que as alterações funcionais e a mortalidade estão diretamente relacionadas à proporção da superfície corporal queimada.

A fisioterapia respiratória é obrigatória e fundamental na composição da equipe multiprofissional em unidade de terapia intensiva e enfermaria. No presente estudo, 61,8% dos pacientes necessitaram de fisioterapia respiratória. Em um estudo realizado com pacientes, maiores de 18 anos, na Coreia do Sul, que tiveram SQC maior que 25% e lesão inalatória associada, foram avaliados os efeitos da reabilitação pulmonar, observou-se melhora no pico de fluxo de tosse, na mobilidade diafragmática, na pressão inspiratória máxima e na capacidade de difusão de monóxido de carbono18.

A fisioterapia é essencial na reabilitação do paciente com queimaduras, dado que podem surgir complicações pulmonares imediatas ou tardias10. Além disso, a fisioterapia motora em pacientes queimados previne as complicações musculoesqueléticas mais comuns, como as contraturas e cicatrizes hipertróficas, logo, ambas desempenham um papel importante na manutenção da funcionalidade de todas as estruturas, sendo o paciente assistido inteiramente19.

A queimadura em crianças e adolescentes ainda é considerada um problema de saúde pública, visto que, além das repercussões funcionais e emocionais, existem ainda os custos relativos ao tempo de internação na enfermaria ou UTI e atendimento ambulatorial, uma vez que o processo de recuperação é a longo prazo. Dessa forma, apesar dos estudos epidemiológicos já terem identificado a escaldadura como principal fator causal em crianças de menor idade, os esforços na realização de campanhas preventivas mantêm-se indispensáveis, assim como a implementação de medidas educativas e preventivas para o público adolescente.

Este estudo teve como limitações a dificuldade de encontrar dados referentes ao setor de Enfermaria e UTI pediátrica, impossibilitando identificar a quantidade de dias que as crianças ou adolescentes permaneceram na UTI, já que as evoluções foram realizadas no mesmo prontuário, ademais, alguns prontuários encontravam-se incompletos. Neste contexto, nota-se uma necessidade de implementação de um setor estatístico que possa facilitar a obtenção de outras importantes variáveis clínicas.


CONCLUSÃO

Conclui-se que o perfil epidemiológico de crianças e adolescentes de um hospital público de Goiânia é majoritariamente composto por adolescentes do sexo masculino e o principal fator causal das queimaduras foi o líquido inflamável, sendo o álcool o predominante. Quanto à profundidade das queimaduras, predominaram as de 2° grau. A SQC teve uma distribuição homogênea, entretanto, 38,2% tiveram mais de 30% de SQC. As partes mais acometidas foram, respectivamente, os membros superiores, membros inferiores, tronco anterior, cabeça/face.

A média de dias de internação dos pacientes foi de 26 dias, com taxa de óbito pequena. A necessidade de internação em UTI foi de 40% e 29,1% precisaram de VM. As limitações funcionais que se destacaram foram a diminuição da ADM e cicatrizes hipertróficas. Houve relação significativa da idade com o fator causal, sendo as crianças menores relacionadas com a escaldadura e os adolescentes com o álcool. Outra relação encontrada foi uma maior SQC com a redução de ADM, com necessidade de UTI e óbito.

A fisioterapia motora foi realizada com quase a totalidade dos queimados e a respiratória em 61,8% dos pacientes. Por fim, esse conhecimento proporcionará aos profissionais de saúde um melhor entendimento sobre os desfechos clínicos das queimaduras, assim como, reforçará a importância de frequentes campanhas preventivas voltadas às crianças e aos adolescentes.


AGRADECIMENTOS

Agradecemos à Secretaria Estadual de Saúde do Estado de Goiás e ao Hospital Estadual de Urgências da cidade de Goiânia pela oportunidade de realização deste estudo.


REFERÊNCIAS

1. Mentrikoski JM, Duncan CL, Enlow PT, Aballay AM. Predicting Adolescents' Intentions to Engage in Fire Risk Behaviors: An Application of the Theory of Planned Behavior. Burns. 2019;45(5):1242-50.

2. World Health Organization. Burns [Internet]; 2018 [acesso 2020 Abr 5]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs365/en/

3. World Health Organization. Adolescent health [Internet]; 2021 [acesso 2022 Fev 10]. Disponível em: https://www.who.int/health-topics/adolescent-health#tab=tab_3

4. Takino MA, Valenciano PJ, Itakussu EY Kakitsuka EE, Hoshimo AA, Trelha CS, et al. Perfil epidemiológico de crianças e adolescentes vítimas de queimaduras admitidos em centro de tratamento de queimados. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(2):74-9.

5. Nigro MVAS, Maschietto SM, Damin R, Costa CS, Lobo GLA. Epidemiological profile of 0-18-year-old child victims of burns treated at the Plastic Surgery and Burns Service of a University Hospital in Southern Brazil. Rev Bras Cir Plást. 2019;34(4):504-8.

6. Kagan RJ, Peck MD, Ahrenholz DH, Hickerson WL, Holmes J 4th, Korentager R, et al. Surgical management of the burn wound and use of skin substitutes: an expert panel white paper. J Burn Care Res. 2013;34(2):e60-79.

7. Zissman S, Orgil M, Ben-Amotz O, Gur E, Arad E, Leshem D. Pediatric burns in Israeli natives versus asylum seekers living in Israel: Lessons learned. Burns. 2018;44(5):1322-9.

8. Sheridan RL. Burn Care for Children. Pediatr Rev. 2018;39(6):273-86.

9. Vale ECS. Primeiro atendimento em queimaduras: a abordagem do dermatologista. An Bras Dermatol. 2005;80(1):9-19.

10. Kliegman RM, Stanton BF St. Geme JW Schor NF Nelson Tratado de Pediatria. 20ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2018.

11. Barros LAF, da-Silva SBM, Maruyama ABA, Gomes MD, Muller KTC, Amaral MAO. Estudo epidemiológico de queimaduras em crianças atendidas em hospital terciário na cidade de Campo Grande/MS. Rev Bras Queimaduras. 2019;18(2):71-7.

12. Carvalho BDP Melchior LMR, Santos ER, Margarida MCA, Costa CSN, Porto PS. Perfil epidemiológico de pacientes vítimas de queimadura atendidos em um hospital público de urgência do estado de Goiás. Rev Bras Queimaduras. 2019;18(3)167-72.

13. Lee CJ, Mahendraraj K, Houng A, Marano M, Petrone S, Lee R, et al. Pediatric burns: A Single Institution Retrospective Review of Incidence, Etiology, and Outcomes in 2273 Burn Patients (1995-2013). J Burn Care Res. 2016;37(6):e579-e585.

14. Fernandes FM, Torquato IM, Dantas MS, Pontes Junior Fde A, Ferreira Jde A, Collet N. Burn injuries in children and adolescents: clinical and epidemiological characterization. Rev Gaúcha Enferm. 2012;33(4):133-41.

15. Bousema S, Stas HG, van de Merwe MH, Oen IM, Baartmans MG, van Baar ME; Dutch Burn Repository group, Maasstad Hospital Rotterdam. Epidemiology and screening of intentional burns in children in a Dutch burn centre. Burns. 2016;42(6):1287-94.

16. Barcellos LG, Silva APP Piva JP Rech L, Brondani TG. Características e evolução de pacientes queimados admitidos em unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Bras Ter Intensiva. 2018;30(3):333-7.

17. Oliveira DS, Leonardi DF. Sequelas físicas em pacientes pediátricos que sofreram queimaduras. Rev Bras Queimaduras. 2012;II(4):234-9.

18. Won YH, Cho YS, Joo, SY Seo CH. The Effect of a Pulmonary Rehabilitation on Lung Function and Exercise Capacity in Patients with Burn: A Prospective Randomized SingleBlind Study. J Clin Med. 2020;9(7):2250.

19. Santana CM, Brito C, Costa AC. Importância da fisioterapia na reabilitação do paciente queimado. Rev. Bras. Queimaduras. 2012;II(4):240-5.









Recebido em 7 de Julho de 2021.
Aceito em 18 de Abril de 2022.

Local de realização do trabalho: Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia, GO, Brasil.

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.


© 2024 Todos os Direitos Reservados