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Relato de Caso

Cobertura de hidrofibra com carboximetilcelulose (Aquacel Ag®) em pacientes queimados: Um relato de caso

Hydrofiber dressing with carboxymethylcellulose (Aquacel Ag®) in burn patients: A case report

Laura Chen1; Ana Carolina de Castro Hadad2; Daniela Carreiro Mello3; Fernanda Coura Pena de Sousa4

RESUMO

INTRODUÇAO: O tratamento de queimaduras sempre foi um grande desafio devido aos diferentes níveis de gravidade das lesoes. Neste contexto, coberturas modernas a base de prata estao sendo cada vez mais utilizadas nesses pacientes.
RELATO DE CASO: Descrever os benefícios do curativo Aquacel Ag® em lesoes por queimadura de 2° grau profundo e 3° grau em paciente atendida na Unidade de Tratamento de Queimados em um hospital de referência em queimaduras e trauma. A paciente teve várias perdas de enxertia devido a quadros infecciosos, sendo a infecçao uma das principais variáveis que atrasam a enxertia cutânea. Quando foi introduzido o Aquacel Ag® no tratamento, observou-se melhora da área a ser enxertada. O Aquacel Ag® em queimaduras parciais garantiu menor tempo de cicatrizaçao, melhor resposta à dor, custo e efetividade em relaçao a outras coberturas, tempo de trabalho de enfermagem, maior conforto na hora da troca de curativo.
CONSIDERAÇOES FINAIS: O Aquacel Ag® mostrou-se uma boa escolha de cobertura para queimaduras de espessura parcial, um grande aliado para preparo de lesoes de 3° grau para enxertia, além de promover outros benefícios ao paciente.

Palavras-chave: Queimaduras. Curativos Oclusivos. Cicatrização.

ABSTRACT

INTRODUCTION: The treatment of burns has always been a great challenge due to the different severity levels of the lesions. Taking this into consideration, modern silver-based wound dressings has been increasingly used in these patients.
CASE REPORT: To describe the benefits of the Aquacel Ag® dressing in burn lesions of 2nd and 3rd grade in patients treated at the Burn Treatment Unit in a reference hospital in burns and trauma. The patient had several grafting losses due to infectious conditions, with infection being one of the main variables that delay skin grafting. When Aquacel Ag® was introduced in the treatment, improvement of the area to be grafted was observed. The Aquacel Ag® in partial burns, guaranted a shorter healing time, better response to pain, cost and effectiveness in relation to other coverages, nursing work time, and greater comfort at the time of dressing change.
FINAL CONSIDERATIONS: Aquacel Ag® has been shown to be a good choice of coverage for partial thickness burns, a great ally for the preparation of 3rd degree lesions for grafting, in addition to promoting other benefits to the patient.

Keywords: Burns. Occlusive Dressings. Wound Healing.

INTRODUÇAO

Queimaduras sao umas das formas mais graves de trauma, representando a quarta maior causa de óbitos nos Estados Unidos, e a quinta causa de morte acidental no mundo. No Brasil é estimado que cerca de 1.000.000 indivíduos se queimem por ano. Desta maneira, evidenciam-se elevadas taxas de internaçoes, assim como de mortalidade1,2. O paciente queimado tem um dos custos mais elevados da rede de alta complexidade, pois o seu tratamento pode ultrapassar R$ 1.500,00 por dia2; além disso, sao pacientes que enfrentam um longo período de internaçao e geralmente apresentam limitaçoes físicas e emocionais3.

O tratamento sempre foi um desafio, pelos diferentes níveis de gravidade das lesoes e pela multiplicidade de complicaçoes que os pacientes apresentam após exposiçao4,5. Diversas formas de tratamento sao aplicadas no paciente queimado, sendo esses cuidados locais e sistêmicos. Várias substâncias têm sido utilizadas de forma local no paciente queimado, geralmente, que aceleram o processo de cicatrizaçao e possuem açao antimicrobiana6.

Dentre as coberturas mais utilizadas, destacam-se a sulfadiazina de prata 1%, materiais substitutivos de pele, oxigenoterapia hiperbárica e coberturas impregnadas de prata6. A prata é utilizada como agente antimicrobiano no tratamento de queimaduras desde a Idade Antiga7.

Produtos à base de prata sao utilizados no tratamento de queimaduras com muito êxito. A sulfadiazina de prata 1% é bastante recomendada no tratamento inicial de queimaduras de segundo e terceiro grau, devido ao seu efeito antimicrobiano de amplo espectro, porém uma desvantagem dessa cobertura é a necessidade de trocas diárias devido à oxidaçao da prata6,7.

As novas coberturas impregnadas com prata vêm ganhando espaço no tratamento das queimaduras de espessura parcial e total. O maior objetivo é exercer uma atividade bactericida mais duradoura no leito da ferida e menor toxicidade para as células lesadas, mas com capacidade de recuperaçao. Esses novos curativos apresentam um amplo espectro antimicrobiano contra as bactérias Gram positivas e Gram negativas7.

Dentre essas novas modalidades de cobertura impregnadas com prata, destacamos a hidrofibra com carboximetilcelulose e prata (Aquacel Ag®), que se trata de um curativo tópico retentor de umidade, que pode liberar prata por até 14 dias. Tem em sua composiçao hidrofibra com 1,2% de prata, que também dispensa o uso de curativos secundários para absorçao de exsudatos e outras secreçoes. Estudos demonstraram uma importante atividade antimicrobiana deste curativo contra patógenos, incluindo aeróbios e anaeróbios, fungos e bactérias resistentes a antibióticos7.

Diante do exposto, o objetivo deste relato é descrever os benefícios do curativo com Aquacel Ag® em lesoes por queimadura de 2° grau profundo e 3° grau em paciente atendida na Unidade de Tratamento de Queimados (UTQ) em um hospital do município de Belo Horizonte, MG, referência em queimaduras e trauma.


RELATO DE CASO

Paciente D.A.D.R., 69 anos, encaminhada do município de Lavras, MG, com história de acidente doméstico com óleo incandescente no dia 4 de junho de 2016, com relato de 30% de superfície corporal queimada (SCQ), sendo submetida à desbridamento no hospital de origem. Admitida em um hospital pronto-socorro de grande porte, referência em tratamento de queimaduras, localizado no município de Belo Horizonte, no dia 6 de junho de 2016, apresentando lesoes de 2° e 3° grau em face, tronco, membros superiores e coxa direita, que foram tratadas com sulfadiazina de prata 1% e recomendaçao de troca a cada 24 horas.

Após reavaliaçao em 8 de junho, apresentava estimativa de 15% de SCQ. Nos dias que sucederam, realizou alguns desbridamentos, e aproximadamente um mês depois realizou enxertia de pele. Em 72 horas pós-enxertia, notou-se a integraçao de cerca de 50% em algumas áreas, e perda completa na regiao inferior de mamas bilateralmente.

Com a perda da enxertia, optou-se por curativo com malha de parafina (Jelonet) associado a ácidos graxos essenciais (AGE) e Iodopovidona (PVPI) tópico. A evoluçao, a regiao torácica encontrava-se cruenta e com tecido necrótico, resultando em perda da enxertia. Após alguns dias, realizou-se nova enxertia nessa área. A evoluçao, observou-se integraçao de 50% do enxerto, realizando curativo diário com AGE e Jelonet.

Em 25 de julho de 2016 a lesao apresentava esfacelo aderido ao leito e pequenos coágulos em regiao mamária, sendo sugerida juntamente com a equipe multidisciplinar a utilizaçao de hidrogel com alginato de cálcio como cobertura primária e Aquacel Ag® como cobertura secundária. A troca era realizada com no máximo 48 horas para melhor acompanhamento.

Em 29 de julho de 2016 a paciente mostrou-se colonizada, os curativos especiais estavam com muita secreçao, resultando em perda quase total dos enxertos. Foi iniciada descolonizaçao com clorexidina e PVPI em dias alternados. Realizados curativos diários com sulfadiazina 1% nas áreas cruentas.

Foi realizada em 30 de julho nova enxertia cutânea em regiao mamária. A regiao encontrava-se bastante exsudativa e com pequenos pontos de necrose em mama esquerda. No dia 1 de agosto recomendou-se o retorno com curativo com Aquacel Ag® associado a alginato de cálcio e hidrogel. Em avaliaçao após 72 horas, percebeu-se a perda quase total dos enxertos, porém manteve-se o curativo proposto.

Após 24 horas, a paciente evoluiu com perda de todos os enxertos no tronco anterior. O tecido de granulaçao era pobre, evidenciando as más condiçoes no momento de enxertia cutânea. Manteve-se o curativo de hidrogel com alginato e Aquacel Ag® (Figuras 1 e 2).


Figura 1 - Uso do Aquacel® junto com o hidrogel.


Figura 2 - Lesao após colocar Aquacel® com hidrogel.



Em 11 de agosto foi realizada enxertia cutânea de tronco anterior. Em 18 de agosto foi observada integraçao de 90% da enxertia das áreas tratadas, recebendo alta da unidade de grandes queimados após um mês, obtendo evoluçao bem satisfatória. Teve alta hospitalar com acompanhamento ambulatorial.


DISCUSSAO

Queimaduras de espessura total ou parcial profundas sao consideradas as mais graves, sendo que, no processo de sua reepitelizaçao, torna-se necessário desbridamento e enxertia precoce8. O sucesso da enxertia depende de um planejamento cirúrgico adequado. Isso inclui a indicaçao do enxerto a ser usado, a escolha da área doadora, o preparo rigoroso do leito receptor e a fixaçao do enxerto. Estes sao fatores determinantes na integraçao do enxerto4. O bom preparo da área a ser enxertada é primordial para garantir na boa aderência do enxerto, tanto ele sendo autólogo como homólogo.

A paciente teve várias perdas de enxertia devido a quadros infecciosos, sendo a infecçao uma das principais variáveis que atrasam a enxertia cutânea8. Quando foi introduzido o Aquacel Ag® no tratamento, observou-se melhora da área a ser enxertada.

O Aquacel Ag® está indicado em queimaduras de 2° grau superficial e profundo. Estudos mostraram a eficácia do Aquacel Ag® em queimaduras parciais9-12, garantindo menor tempo de cicatrizaçao, melhor resposta à dor, custo e efetividade em relaçao a outras coberturas, tempo de trabalho de enfermagem, maior conforto na hora da troca de curativo.

O Aquacel Ag®, por manter um efeito bactericida prolongado, permite que as lesoes se mantenham estéreis, úmidas e sem necessidade de trocas frequentes, que retardam o processo de cicatrizaçao através da remoçao de queratinócitos que migram a partir da membrana basal da epiderme junto ao curativo7.

Na paciente em questao, foi possível observar que, além da melhora das áreas com queimaduras de 2° grau tanto superficial quanto profunda, o Aquacel também permitiu que as áreas com queimaduras de 3° grau fossem mais bem preparadas para receber o enxerto. O curativo permitiu o desbridamento autolítico da lesao, auxílio na formaçao de tecido de granulaçao, diminuindo as chances de rejeiçao à enxertia. Dentre estes benefícios, pode-se proporcionar melhor conforto à paciente, pelo tempo de troca de curativo, que ocorriam de 48 em 48 horas, pois o curativo permite trocas mais prolongadas, em relaçao à sulfadiazina de prata a 1%, como observado em outros estudos9-11.

Outro ponto a ressaltar foi a nao necessidade de repetiçao das medicaçoes nas trocas de curativo, quando comparado com o uso da sulfadiazina de prata a 1%, que promovia maior desconforto por ficar mais aderida na lesao, necessitando grande esforço para sua remoçao e trocas com maior frequência, deixando o paciente mais exposto.

Apesar dos benefícios descritos neste estudo de caso, e o que outros autores mostraram em suas pesquisas6,7,9-12 com o Aquacel Ag®, o atual protocolo clínico da Instituiçao preconiza o banho diário com água morna e clorexidine degermante 2% e curativo duas vezes ao dia com sulfadiazina de prata 1% na enfermaria13. Entretanto, as condutas sao avaliadas diariamente por equipe multidisciplinar e as coberturas especiais estao cada vez mais fazendo parte da rotina da UTQ. A equipe da unidade tem a prática de realizar curativos com Jelonet associado a AGE e PVPI tópico em pós-enxertias, realizando troca de 72 em 72 horas, avaliando a aderência e viabilidade. Esta conduta tem apresentado bons resultados, apesar de nao haver evidências científicas que comprovem sua eficácia desta rotina.


CONSIDERAÇOES FINAIS

O Aquacel Ag®, além de ser uma boa escolha de cobertura para queimaduras de espessura parcial, mostrou-se grande aliado para preparo de lesoes de 3° grau para enxertia, melhorando a resposta à dor da paciente, com menor tempo de enfermagem, menor utilizaçao de medicamentos para dor, maior conforto ao paciente nas trocas de curativo, assim reduzindo custos, incentivando outros estudos para o curativo nas lesoes de 3° grau.


REFERENCIAS

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8. Kikoso D, Santos NSV, Arruda PDM, Gomide NFM, Stanzani FR, Vidal MA. Avaliaçao das variáveis associadas à demora na enxertia do queimado agudo. Rev Bras Queimaduras. 2014;13(4):226-31.

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11. Verbelen J, Hoeksema H, Heyneman A, Pirayesh A, Monstrey S. Aquacel(®) Ag dressing versus ActicoatTM dressing in partial thickness burns: a prospective, randomized, controlled study in 100 patients. Part 1: burn wound healing. Burns. 2014;40(3):416-27.

12. Yarboro DD. A comparative study of the dressings silver sulfadiazine and aquacel ag in the management of superficial partial-thickness burns. Adv Skin Wound Care. 2013;26(6):259-62.

13. Protocolo Clínico. Atendimento ao queimado 039. Unidade de Tratamento de Queimados - UTQ - Professor Ivo Pitanguy. Belo Horizonte: Hospital Joao XXIII/FHEMIG; 2013.









Recebido em 26 de Junho de 2018.
Aceito em 12 de Maio de 2019.

Local de realização do trabalho: Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.


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